Por Joel S. Alves *
O uso de atuação e transmissão de força hidráulica é cada vez mais frequente no maquinário agrícola, principalmente no trator. A sua aplicação teve início com o advento do sistema de três pontos, sendo utilizada inicialmente para suspender implementos – um emprego bastante simples (apenas levantar o peso), dado que o equipamento retorna ao solo pela força da gravidade. Com o tempo, os comandos hidráulicos foram aperfeiçoados, permitindo controles de profundidade, sensibilidade e vazão, com maior rapidez de resposta.
Atualmente, tratores extrapesados possuem esse recurso como opcional, pois a maioria dos implementos é de arrasto e usa o sistema hidráulico com comando independente para cada função, possibilitando vários tipos de recursos hidráulicos, como subir, abrir, aumentar ou diminuir os ângulos dos dispositivos junto ao solo, além de regular profundidade ou inclinação, suspender para transporte e acionar motores hidráulicos, entre uma infinita gama de recursos. Tudo isso utilizando dispositivos com acoplamento e conexões de engate rápido e controle de cabine (sistema de controle remoto).
Há ainda o uso da hidráulica para sistema de transmissão da força mecânica do motor até as rodas (transmissão hidrostática), em substituição a conjuntos mecânicos. Isso é o que há de mais atual, pois possibilita infinitas variações de reduções com velocidades mais exatas, principalmente para Agricultura de Precisão. Neste artigo, analisaremos a força hidráulica em três tópicos: dispositivo de três pontos, sistema de controle remoto e transmissão hidrostática.
Dispositivos de três pontos
Esse dispositivo utiliza a força hidráulica apenas para fazer levantar duas hastes que suspendem dois braços reguláveis onde é acoplado o implemento. Há um terceiro braço regulável onde se ajusta a inclinação do implemento. Portanto, esse mecanismo utiliza apenas um cilindro hidráulico de ação simples, ou seja, a força hidráulica é direcionada apenas em um sentido, pois o retorno é realizado pelo próprio peso do implemento.
Componentes e funcionamento do sistema – bomba hidráulica, reservatório, cilindro, válvula de controle, válvula de alívio e alavancas de comando.
A bomba pode ter seu acionamento direto pelo motor ou junto à transmissão, neste caso, assim que entra em funcionamento, pressuriza o sistema com óleo aspirado do reservatório. O óleo pode ser o mesmo empregado na lubrificação do sistema de transmissão ou um óleo exclusivo, sendo então necessário um reservatório específico. Enquanto a alavanca de comando não é acionada o fluxo de óleo é desviado pela válvula de alívio e retorna ao reservatório. No momento que a alavanca é acionada, o óleo é direcionado ao cilindro, onde desloca um pistão e um pino, o qual empurra um eixo com duas hastes nas quais estão os braços do dispositivo.
Modelos de alavancas de comando
Essa alavanca fica localizada ao lado direito, próxima ao banco do operador, e possui três recursos: comando principal (subir e baixar implementos), comando de regulagem da profundidade do implemento no solo, e um terceiro que controla a sensibilidade de atuação do sistema. Assim é o sistema hidráulico de três pontos presentes na imensa maioria dos tratores agrícolas: simples e funcional, atendendo às necessidades operacionais do campo.
Controle remoto
É um sistema hidráulico mais completo, pois deve possibilitar vários tipos de acionamentos, inclusive com cilindros atuadores de dupla ação, ou seja, com uso da força hidráulica para atuar nos dois sentidos.
Componentes e funcionamento do sistema: bomba hidráulica, reservatório, válvulas de controle e de segurança, dispositivos de acoplamento tipo engate rápido, tubulações e conexões, além dos cilindros que devem estar no implemento.
Neste sistema, a bomba é acionada diretamente pelo motor. O reservatório na maioria dos tratores ainda é o mesmo do óleo da transmissão, mas há alguns modelos com reservatório e óleo específicos, o que favorece o desempenho do sistema. As válvulas de controle possuem três posições: comando em um sentido, comando no sentido inverso, e circuito aberto, no qual o óleo retorna para o reservatório, mas mantém o cilindro calçado na posição selecionada.
Alguns sistemas possuem ainda uma quarta posição no comando – a de flutuação, em que o cilindro não permanece calçado com pressão de óleo mas flutua para um lado ou outro conforme o deslocamento da máquina e do solo. O comando dessas válvulas pode se dar diretamente por alavancas posicionadas ao lado direito do operador ou por comando eletro-hidráulico junto ao console, também posicionado à direita do operador.
Transmissão hidrostática
Este recurso utiliza a hidráulica para transmissão de força rotativa com várias opções de velocidade e força, em substituição aos conjuntos mecânicos de eixos e engrenagens. No maquinário agrícola está sendo empregado de duas formas: algumas máquinas substituíram completamente a transmissão mecânica pelo conjunto hidráulico – é o caso dos pulverizadores autopropelidos; enquanto outras mantiveram alguns conjuntos mecânicos e intercalaram um sistema hidráulico apenas para variação de força e velocidades – incluem-se neste caso as colheitadeiras hidrostáticas e os tratores com transmissão constantemente variável (CVT, AVT ou VT).
Componentes e funcionamento do sistema: bomba hidráulica, motor hidráulico, válvulas de controle e de segurança, manifold de comando eletro-hidráulico, reservatório, mangueiras e conexões. Neste sistema a bomba hidráulica é acoplada diretamente ao motor diesel, sendo uma bomba de pistão para alta pressão e vazão, pois os motores hidráulicos tracionários exigem tal condição para executarem a força torcional necessária. Há dois tipos de bombas de pistões: radiais e axiais, bem como os motores hidráulicos também podem ser radiais ou axiais.
Nos sistemas totalmente hidráulicos há um motor para cada roda da máquina e duas bombas, uma para cada dois motores. Esses motores estão posicionados diretamente na ponta do eixo junto ao cubo de roda, dispensando, assim, vários recursos mecânicos. A partir do funcionamento do motor diesel, a bomba já alimenta todo o sistema. O controle operacional é feito pelo operador por uma manete deslizante. Estando com a manete em neutro os motores ficam bloqueados pelo próprio sistema, enquanto, no momento que é selecionada uma posição a frente ou atrás, a pressão de óleo é liberada num sentido ou outro para os motores hidráulicos, pois aceitam trabalhar em qualquer sentido de rotação. A proporcionalidade na posição da manete também corresponde a uma maior ou menor rotação nos motores, assim produzindo mais ou menos força e velocidade.
O automatismo entre força e velocidade é controlado pelo bloco eletro-hidráulico conhecido como “manifold”. É um sistema simples e altamente eficiente, o qual dispensa todo o conjunto de embreagem, eixos, engrenagens, luvas deslizantes e dispositivos de acoplamentos mecânicos. Contudo, requer cuidado especial quanto à pureza e qualidade do óleo hidráulico. Nota: mais do que nunca as revisões e períodos de troca recomendados devem ser realizados.
Outro aspecto importante, do ponto de vista da segurança para as equipes de operação e manutenção, são as condições das mangueiras e conexões, pois o sistema trabalha com pressão acima de trezentos quilos por centímetro quadrado – em casos de rupturas há riscos significativos.
Encontramos também nos tratores agrícolas um sistema de transmissão misto, em que são mantidos alguns conjuntos mecânicos, porém, a variação de força e velocidade é hidráulica. Esse sistema, chamado de AVT, CVT e VT – ou simplesmente transmissão infinitamente variável –, dependendo da marca e do modelo, aplica-se muitas vezes aos modelos de maior potência e aos chamados “top” de linha. A tendência, no entanto, é que estendam para todos os modelos pela simplicidade e eficiência.
O conjunto hidráulico completo (bomba, motor e manifold) fica instalado na posição onde se encontrava a caixa de marchas nos modelos mecânicos, sendo que os demais conjuntos, como diferencial, eixos, redutores e semieixos de tração, permanecem presentes.
Recomendações
É de fundamental importância realizar manutenções preventivas dos conjuntos hidráulicos, pois são serviços simples de serem executados e na maioria das vezes envolve apenas a troca do óleo e do filtro. Esse cuidado, naturalmente, envolve custos, mas devemos considerar que a falta de manutenção adequada, nos intervalos previstos, gera problemas com mais elevados– portanto, não vale a pena descuidar. A simplicidade da transmissão de força nos aponta para um caminho seguro e inevitável no maquinário agrícola.
Assim, com este artigo, concluímos esta série de abordagens “Especial Trator”. Esperamos ter contribuído para divulgar o conhecimento da estrutura e funcionamento do trator agrícola, máquina versátil e de larga aplicação no meio rural. Como instrutor de treinamento dessa área sei perfeitamente que temos um longo caminho a percorrer, até que possamos chegar próximo ao ideal e ao equilíbrio esperado entre manutenção, operação, recursos financeiros e equipes de trabalho qualificadas.
Joel S. Alves é instrutor nas áreas de Operação e Manutenção de Máquinas e Implementos Agrícolas e Rodoviários *