Máquinas e Inovações Agrícolas

Artigo: Gestão do solo para desenvolvimento sustentável

*Por Mariane Crespolini e Petula Ponciano Nascimento

A carência de informações detalhadas sobre os solos brasileiros é um grande entrave para o desenvolvimento do país. Apenas 5% do território nacional conta com mapeamentos em escalas adequadas, dificultando ações para a promoção do desenvolvimento sustentável. Em 2020, isso começou a mudar com a implementação das ações do Programa Nacional de Levantamento e Interpretação de Solos no Brasil (PronaSolos). Para 2021, o desafio aumentou e esta importante política pública busca o apoio de parcerias, no modelo público-privado.

Com dimensões continentais, o Brasil partiu para o desafio de conhecer melhor e cuidar do principal patrimônio natural do cidadão brasileiro, para assim promover todos os setores da economia. Não apenas a agropecuária, mas, também, indústria, geração e distribuição de energia, saneamento básico, telecomunicações.

Coordenado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), envolvendo Embrapa, Casa Civil da Presidência, outros cinco ministérios e cerca de 30 instituições públicas e privadas, o programa busca engajar diferentes setores para mapear minuciosamente os solos de 1,3 milhão de km² do país, nos primeiros 10 anos, e mais 6,9 milhões de km² até 2048, em escalas que permitam um nível de detalhamento muito significativo dos solos.

A construção do PronaSolos, um programa de Estado, começou em 2013, quando o mundo despertava para a importância da ciência do solo para a segurança alimentar. Dois episódios foram fundamentais. O primeiro foi o acórdão 142/2015 do Tribunal de Contas da União (TCU), que deu ênfase à falta de governança e apontou a insuficiência de informações e a dificuldade de acesso a dados de nossos solos. O segundo foi a mobilização interinstitucional liderada pelo Mapa e pela Casa Civil, que formularam a proposta de um programa nacional apoiados pelas instituições que atuam com base na ciência do solo. A formalização do PronaSolos aconteceu em 2018, e a nomeação dos comitês estratégico e executivo, em 2020, por decretos presidenciais.

Em dezembro, foi entregue à sociedade brasileira a versão 1.0 da plataforma tecnológica do PronaSolos, uma das mais modernas do mundo. Por meio de um sistema de informações geográficas (SigWeb), ela reúne mapas e dados de solos produzidos ao longo dos últimos 60 anos por diversas instituições. Pela primeira vez, é possível acessar um vasto acervo sobre solos brasileiros em um único local.

Alguns dos mapeamentos são inéditos, como os mapas nacionais de suscetibilidade e vulnerabilidade dos solos brasileiros à erosão hídrica. Eles podem subsidiar o setor produtivo e o poder público na seleção de áreas para ações de conservação e recuperação. Em breve, serão disponibilizados o mapa de condutividade elétrica do solo, importante para os setores de telecomunicações e de transmissão de energia, e o mapa nacional atualizado de estoque de carbono, um pilar fundamental para as finanças verdes e as boas práticas ambientais, sociais e de governança — conhecidas como ESG.

Os maiores desafios do PronaSolos estão no horizonte. É preciso executar os trabalhos de campo previstos para as próximas décadas. Para o agronegócio, será possível planejar, ao nível de propriedade, o melhor uso das terras; realizar manejo mais adequado das culturas e aperfeiçoar práticas que reduzam a erosão; otimizar o uso de fertilizantes e defensivos e os projetos de irrigação; ampliar a adoção de sistemas integrados.

O PronaSolos terá, ainda, impactos para muito além da agropecuária. Será possível, por exemplo, otimizar a expansão urbana; reduzir a sedimentação dos rios, enchentes e desastres naturais; criar mecanismos mais precisos para avaliação das terras e apoiar a concessão de crédito agrícola, reduzindo riscos para agricultores e financiadores. O programa também viabilizará que todos os municípios tenham zoneamento agroecológico (ZAE), ferramenta fundamental para o desenvolvimento sustentável.

A força das parcerias, presente desde o início do PronaSolos, terá que ser intensificada para que esses avanços aconteçam e beneficiem o setor produtivo e a sociedade. Os desafios exigem engajamento das esferas públicas e privadas. Hoje, a legislação dá oportunidades para a criação de consórcios público-privados e para a formação de fundos financeiros de apoio à inovação. O PronaSolos é inovação tecnológica, institucional e social. Quem ganha é o Brasil.

*Mariane Crespolini — diretora de Produção Sustentável do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa)
*Petula Ponciano Nascimento — Chefe-Geral da Embrapa Solos (RJ)
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