Máquinas e Inovações Agrícolas

A adoção do Sistema de Plantio Direto para um campo mais sustentável

Sistema de plantio direto está presente em mais de 36 milhões de hectares no País e traz inúmeras vantagens, como evitar a erosão hídrica e eólica dos solos

por Gustavo Paes – Prática que começou no final da década de 1960, no Rio Grande do Sul, o Plantio Direto (PD) completou 50 anos no Brasil em 2022. Hoje, 23 de Outubro, é celebrado o Dia Nacional do Plantio Direto, instituído pelo Projeto de Lei 3908/2015. A data celebra o dia em que foi realizado o primeiro plantio em escala comercial, da lavoura de soja sob plantio direto, em 1972 por Herbert Bartz, em Rolândia no Paraná, que segundo ele, protegeria seu solo da erosão.

No Brasil, há dois anos, o manejo conservacionista ocupava uma área de 36 milhões de hectares, o que faz o País ter a maior área com PD em todo o mundo, segundo dados divulgados pelo Projeto Soja Brasil, uma iniciativa da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja) e da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

Adotado por produtores de culturas tão diversas como soja, milho, trigo, feijão, arroz, algodão, café, melancia e aipim, o Sistema Plantio Direto (SPD) visa a produção de alimentos, fibras e energia em harmonia com a natureza, baseando-se em três pilares: o não revolvimento do solo (restrito à linha de semeadura ou covas para mudas), a cobertura permanente do solo (plantas vivas ou palhadas) e a diversificação de plantas na rotação de cultivos.

Cultivo consorciado com mandioca e feijão traz boa produtividade

O conceito de PD começou a ser implementado em 1940 com o norte-americano Edward H. Faulkner, mas só passou a ser adotado no mundo após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Comparado a sistemas que utilizam o preparo do solo, o chamado plantio na palha traz vantagens como a redução da erosão hídrica e eólica dos solos, da emissão de gases causadores do efeito estufa, bem como o uso de combustíveis fósseis e de agroquímicos. 

A técnica também possibilita o aumento da infiltração da água e a eficiência dos fertilizantes aplicados e a recuperação da matéria orgânica, da biodiversidade e da resiliência do solo. O manejo ainda reduz o efeito negativo das máquinas agrícolas e da própria agricultura, o que garante uma atividade mais sustentável. E o agricultor ainda tem menores custos de produção ao eliminar operações de plantio do solo.  

Plantio direto do algodão sobre a palha do milho. // Foto: Fabiano Perina/Embrapa Algodão

Apesar da rápida expansão, o manejo conservacionista enfrenta desafios e metas a serem atingidas. Da área total com adoção do PD em pouco mais de 15% é praticado o Sistema Plantio Direto (SPD) fundamentado nos três pilares. Cerca de 85% a 90% da área, que hoje é contabilizada como PD, aplica um ou dois pilares. O que mostra que uma parcela expressiva dos produtores rurais não está aplicando os três princípios fundamentais adequadamente, o que vem provocando compactação e erosão dos solos.

A meta é chegar em 2030 com 12,54 milhões de hectares a mais em PD. E alcançar, neste mesmo período, 48,5 milhões de hectares em PD de grãos, sendo 35% a 50% em SPD (fundamentado nos três pilares) e não 15% como é hoje. 

O pesquisador José Eloir Denardin, da Embrapa Trigo, de Passo Fundo (RS), explica que o SPD, para ser assim reconhecido, requer pelo menos duas safras por ano agrícola estruturadas em modelos de produção que contemplem o cultivo de pelo menos uma gramínea de verão a cada três safras. “Com base em informações da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), pode-se concluir que o SPD ocupa, no máximo, 15,4 milhões de hectares no Brasil”, assegura o pesquisador. 

Vantagens

Denardin, que atua desde 1976 no Centro Nacional de Pesquisa de Trigo (atual Embrapa Trigo) e representa a Embrapa na Federação Brasileira do Sistema Plantio Direto (Feprapdp), salienta que o SPD é uma ferramenta da agricultura conservacionista capaz de viabilizar o ato de produzir sem preparo prévio do solo, de modo contínuo, safra após safra. 

Em consequência, o SPD requer menos máquinas e equipamentos, menor força de trabalho e menos energia fóssil (petróleo) e favorece a atividade biológica do solo e o controle biológico de pragas, doenças e plantas daninhas. 

Além disso, lembra o especialista, o SPD praticamente elimina a erosão, melhora o uso de fertilizantes, aumenta a floculação e a agregação do solo e reduz a decomposição da matéria orgânica, estabelecendo sincronismo entre a disponibilidade de nutrientes e o crescimento das formas de vida presentes no solo.

Denardin afirma que o SPD, comparativamente a outras formas de manejo, potencializa a obtenção do equilíbrio dinâmico do agroecossistema, disciplinando a entrada e a saída de energia e de matéria, conserva o potencial biológico e lhe dá maior capacidade de autorreorganização. “A adoção do SPD expressa o potencial genético das espécies cultivadas pelo uso adequado do solo, da água e da biodiversidade, protegendo e melhorando os recursos naturais”, afirma o especialista. 

Evolução do maquinário

Em 1969, a Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) importou a primeira semeadora de PD no Brasil, da marca Buffalo, que era fabricada nos Estados Unidos. A semeadora foi usada uma única vez em uma área experimental de 1 hectare no Posto Agropecuário do Ministério da Agricultura, em Não-Me-Toque (RS). A máquina foi destruída acidentalmente em um incêndio.

A Embrapa começou as pesquisas com PD e, em 1978, importou uma semeadora dinamarquesa de cultivo mínimo, a Nordestern, e, em seguida, uma semeadora de fluxo contínuo da marca Bettinson 3-D, da Inglaterra. Os pesquisadores aproveitaram as características construtivas da máquina e os discos duplos desencontrados de origem canadense para construir as primeiras semeadoras, que, na época, eram especializadas em culturas de inverno e grãos finos. 

Em 1989, a Semeato, de Passo Fundo, desenvolveu a TD, o primeiro projeto nacional de máquina para PD. Depois, as empresas Imasa, Fankhauser e Lavrale apresentaram seus produtos.

Produtores pioneiros e oficinas locais do Paraná e Rio Grande do Sul fizeram adaptações no maquinário, principalmente na tentativa de semear culturas de verão, predominantemente a soja. Isso em função de que a máquina disponível nos anos 1970 era a Rotacaster, que, além de mobilizar exageradamente o solo, tinha baixo rendimento. 

No início dos anos 1980, o mercado já contava com semeadoras de fluxo contínuo para o SPD, principalmente da Semeato, Imasa, Fankhauser, Baldan e Marchesan.

A década de 1980 foi um período de estudos e laboratório, quando não havia uma definição clara de como uma semeadora de SPD deveria trabalhar. Conforme o especialista em mecanização agrícola Augusto Guilherme de Araújo, que trabalhou no Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (Iapar), os produtores e oficinas locais adaptavam semeadoras de precisão convencionais e de fluxo contínuo, transformando-as para o SPD, introduzindo disco de corte e componentes para abertura de sulco e deposição de fertilizante e sementes. 

Entraves

Nesse processo, as indústrias foram aperfeiçoando seus produtos e criando também semeadoras de precisão para o Sistema de Plantio Direto. As principais dificuldades para a expansão do sistema na década de 1980 foram a falta de herbicidas eficientes ou o desconhecimento dos mesmos e as máquinas que não eram apropriadas, principalmente para trabalhar nas regiões de solos argilosos, os quais nos primeiros anos de adoção apresentavam adensamento superficial. 

Com os trabalhos de pesquisa e a experiência de produtores da época, consolidaram-se os conceitos de rotação de culturas e uso de plantas de cobertura, além da necessidade de adequar o terreno para implantação do SPD. Porém, a alta do preço do petróleo e a elevação dos custos de produção fizeram o produtor adotar o SPD, o que possibilitou menor desgaste das máquinas e resultou no aumento da produtividade das culturas.

Semeadura e lavoura de feijão em plantio direto. Lavoura conduzida na Fazenda Capivara em Santo Antônio de Goiás, GO. // Foto: Sebastião José de Araújo/Embrapa Arroz e Feijão

O ex-pesquisador do Iapar recorda que o desenvolvimento da semeadora de precisão PAR, da Semeato, no início dos anos 1990, foi um marco importante, pois a TD e outras semeadoras de fluxo contínuo não apresentavam o desempenho esperado na semeadura de soja. O que existia era semeadoras adaptadas de máquinas convencionais como era o caso das PS-6, da Semeato. 

A ideia era que a semeadora para o SPD deveria ser pesada, principalmente pelo fato de usarem discos duplos desencontrados como rompedores de solo, e que, nos solos argilosos com adensamento superficial, era praticamente impossível realizar a semeadura. 

“A adoção do SPD mecanizado foi fortalecida a partir de 1992, quando muitas indústrias apresentaram novas máquinas, especialmente as semeadoras de precisão, sempre perseguindo a expansão da cultura de soja, mas sendo usadas também nas demais culturas”, sublinha Araújo. 

Comercialmente, o SPD teve início no Brasil em 1992, no município de Rolândia (PR), com o produtor Herbert Bartz, que usou uma semeadora Allis Chalmers, importada dos Estados Unidos. Durante a década de 1990, várias indústrias, oficinas e produtores em regiões diferentes passaram a utilizar hastes sulcadoras afastadas do disco de corte e foi possível adequar as semeadoras de precisão aos solos argilosos. A partir daí o crescimento foi espantoso e a área sob PD no Brasil saltou de 1 milhão de hectares em 1992 para 25 milhões em 2007. 

Aperfeiçoamentos

As maiores alterações no maquinário próprio para SPD ocorreram na parte inferior das máquinas, conforme Denardin, da Embrapa Trigo. Na parte superior, as mudanças foram mínimas.

“Os discos côncavos, que equipavam as semeadoras destinadas à semeadura em solos sob preparo convencional, evoluíram para o conjunto de disco de corte, destinado ao corte da palha e à abertura do sulco de semeadura, e discos duplos, destinados à deposição da semente no sulco de semeadura”, explica.

Já Araújo avalia que houve um grande avanço tecnológico. Além de crescerem no tamanho, o incremento tecnológico foi ainda maior. Hoje existem equipamentos com mecanismos dosadores de alta precisão, como os pneumáticos, monitores eletrônicos de fluxo de semente e fertilizante, e até aplicação em taxa variável de fertilizante e sementes, considerando os princípios da Agricultura de Precisão. No entanto, diz que ocorreram poucas mudanças nos conjuntos sulcadores das semeadoras.

“Quase nada mudou na parte inferior das máquinas, como os discos de corte, discos duplos, hastes sulcadoras e facão. A indústria fez apenas pequenos aperfeiçoamentos, mas nada muito inovador”, afirma Araújo.

Discos maiores

Mauro César Menão, gerente de negócios de plantio da Jacto, destaca que as semeadeiras de SPD sofreram várias mudanças na busca de maior eficiência no corte da palha. “As máquinas ganharam discos de corte maiores e de diferentes formatos, com ranhuras e ondulações, sempre com o propósito de aperfeiçoamento do plantio sobre a palha”, diz o especialista. 

Nos últimos anos, o maquinário para Sistema de Plantio Direto também teve alterações significativas no design, com a redução de partes sobressalentes e estruturas mais estreitas para permitir um fluxo de palha mais eficiente. “O objetivo foi evitar o embuchamento da palha entre as linhas de plantio e ainda facilitar a transposição de terraços nas lavouras”, explica. 

Os chassis das novas plantadeiras – Meridia, Lumina 400 e Uniport Planter 500, que foram apresentadas pela empresa em agosto de 2020, também estão mais altos. “O elevado vão livre em relação ao solo permite o uso de discos de corte que podem chegar a até 22 polegadas de diâmetro, com um posicionamento adequado para um excelente corte de palha e, ainda, a possibilidade de que o disco supere obstáculos sem danificar a máquina, aumentando a sua vida útil”, sublinha Menão. 

 

ASSINE MÁQUINAS E INOVAÇÕES AGRÍCOLAS – A PARTIR DE R$ 6,90

➜ Siga a Máquinas & Inovações Agrícolas no Instagram e no Linkedin!

Compartilhar