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El Niño na agricultura: estratégias para enfrentar um velho conhecido

El Niño é um fenômeno climático natural caracterizado pelo aquecimento anormal das águas do Oceano Pacífico Equatorial; ele tem influências diretas no clima e pode trazer uma série de efeitos indesejados, inclusive na agricultura

Causado por uma interação complexa entre os ventos, as correntes oceânicas e a atmosfera, o fenômeno El Niño tem uma recorrência variável, demorando de 2 a 7 anos para voltar a ocorrer e intercalando-se com períodos de La Niña e de neutralidade. Os eventos costumam variar em intensidade. Houve eventos muito intensos em 1997-1998 e 2015-2016. Foram secas, inundações e doenças em todo o mundo, com danos e prejuízos da ordem de bilhões de dólares.

Os efeitos do El Niño podem variar bastante nas distintas regiões do globo e mesmo no Brasil, onde, pelas grandes dimensões territoriais, podemos encontrar uma grande diversidade de condições locais, tais como relevo e topografia, que levam a respostas diferenciadas do fenômeno. O Nordeste e o Norte do Brasil são mais propensos a secas durante El Niño, enquanto o Sul e o Sudeste são mais propensos a chuvas mais intensas.

Localizada na faixa de transição entre o clima tropical e o clima subtropical, a região Centro-Oeste se comporta de maneira mais próxima ao que ocorre no Sul do Brasil, entretanto, geralmente esses efeitos tendem a ser menos intensos. Esse também é o panorama de Mato Grosso do Sul, estado pertencente à essa região. Os efeitos na agricultura e pecuária são particularmente importantes em MS, dada a participação dessas atividades na economia local.

El Niño pode causar impactos na agricultura brasileira, aponta Inmet

O Índice Oceânico Niño 3.4 é um dos principais indicadores de El Niño. Ele é calculado com base nas temperaturas da superfície do Oceano Pacífico equatorial, na região entre a costa do Equador e a Polinésia Francesa. De acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM), são necessários três trimestres consecutivos com anomalia acima de 0,5 °C para declarar oficialmente El Niño.

A publicação do valor da anomalia de temperatura do último trimestre (Junho-Julho-Agosto) confirmou que teremos uma safra de verão sob efeitos do El Niño. Desde 2001, essa será a oitava safra de verão cultivada sob efeitos de El Niño.

Os possíveis impactos negativos que preocupam os agricultores são decorrentes do excesso de chuvas, que podem impedir operações de manejo e tratos culturais, e as temperaturas excessivamente altas, que podem afetar diretamente a fisiologia e produção das culturas.

A combinação do aumento das chuvas e temperaturas pode favorecer pragas e doenças, exigindo maior atenção e controle. Mesmo com o aumento dos volumes totais precipitados, ainda existe a preocupação com veranicos em período de El Niño. Isso porque é notável a má distribuição das chuvas nesses períodos, com o agravamento de temperaturas mais elevadas.

O impacto econômico da ocorrência de El Niño deve-se tanto à redução potencial da produção (inclusive por perdas na colheita), como pelo encarecimento dos insumos necessários e práticas agrícolas adotadas (como controle de pragas e doenças). Em qualquer caso, espera-se um incremento no custo de produção por tonelada produzida.

A Tabela 1 reúne informações das safras de soja cultivadas em Dourados sob El Niño, desde 2001. Esta tabela relvela que certa estabilidade da produção, sendo pouco comum encontrarmos reduções drásticas. Apesar disto, o incremento produtivo não acompanha a maior oferta hídrica.

Prevenir os efeitos do El Niño é uma tarefa difícil, uma vez que esse fenômeno climático é natural e sua ocorrência está fora do controle humano. Mas podemos lançar mão de estratégias para reduzir ou mitigar os impactos negativos causados por ele. Muitas técnicas podem requerer um planejamento e ação à longo prazo, tal como a adoção de sistemas mais sustentáveis e resilientes, a exemplo do plantio direto. Um solo mais estruturado e protegido pela palhada torna-se menos susceptível aos efeitos indesejados ou inesperados do clima.

Manejo – Contudo, a ideia neste artigo consiste em nos determos as medidas de curto prazo. Nesse âmbito, uma primeira preocupação que surge refere-se à conservação do solo. Diante de um cenário de chuvas intensas, seria mais adequado evitar ou adiar práticas agrícolas que possam desestruturar o solo, tais como aração, subsolagem ou escarificação. A manutenção de palhada também seria desejável. Inspeção e manutenção de terraços também é uma prática desejada nesse contexto.

Uma outra estratégia é o plantio escalonado, utilizando mais de uma data de plantio e com intervalo de alguns dias entre elas. Com partes da lavoura em diferentes estádios de desenvolvimento existe maior chance de escapar de eventos indesejados, como uma seca no período crítico ou chuva na colheita.

Seguir as recomendações do Zoneamento Agrícola de Risco Climático (ZARC) é outra ação a ser tomada. O ZARC indica épocas com maior chance de sucesso, independentemente da ocorrência de El Niño ou La Niña.

Por fim, numa situação de El Niño, deve-se acompanhar atentamente as previsões de tempo para programar os tratos culturais. Deve-se estar atento para não atrasar as pulverizações de fitossanitários, especialmente porque nesse cenário doenças e pragas tendem a se intensificar. Outra preocupação é com a prática de dessecação para colheita, que não deve ser realizada antes de períodos de chuva.

No geral, El Niño é um fenômeno climático complexo que pode ter impactos significativos na agricultura. É importante estar ciente que os riscos da agricultura são maiores durante esse fenômeno, para adotar estratégias que reduzam seus efeitos negativos.

Éder Comunello, Rodrigo Arroyo Garcia, Danilton Luiz Flumignan, Carlos Ricardo Fietz (Pesquisadores)
Embrapa Agropecuária Oeste

 

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