No Dia Mundial da Água, 22 de março, a Embrapa entrega um resultado de pesquisa à sociedade. Um trabalho com duração de um ano, em que a Embrapa Agropecuária Oeste (Dourados, MS) em parceria com a Embrapa Meio Ambiente (Jaguariúna, SP), monitorou resíduos de agrotóxicos, em amostras de água do Rio Dourados (que pertence à Bacia Hidrográfica do Rio Dourados – BHRD), em Mato Grosso do Sul.
“Estudos de monitoramento dos resíduos de agrotóxicos em águas superficiais são necessários para avaliar os níveis de exposição de organismos não-alvos, incluindo os seres humanos”, diz o pesquisador Rômulo Penna Scorza Júnior da Embrapa Agropecuária Oeste.
“A Embrapa, ao longo de sua história, tem trabalhado e se dedicado a pesquisar soluções e alternativas que contribuam com a conservação, uso e reaproveitamento d’água. A Embrapa Agropecuária Oeste sempre esteve atenta a essa questão, e as pesquisas que vem sendo desenvolvidas ao longo dos anos demonstram essa dedicação”, disse Harley Nonato de Oliveira, chefe geral da Embrapa Agropecuária Oeste.
O objetivo, segundo ele, é a “busca por soluções que contribuam com o uso racional da água no campo e com a sua conservação, através do desenvolvimento de sistema sustentáveis, que permitem melhor infiltração e aumento da quantidade de água armazenada nos solos e nos lençóis freáticos e, nos últimos anos, no desenvolvimento de metodologia e monitoramento da qualidade da água, cujo informações podem apoiar a elaboração de novas políticas públicas”, completou.
Ele enfatiza que esse trabalho é fruto de uma parceria com o Ministério Público de Mato Grosso do Sul, Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho e do Instituto do Meio Ambiente de Dourados a Embrapa Agropecuária Oeste, disponibiliza documento que apresenta metodologia e traz avanços e resultados em relação a avaliação da qualidade desse importante recurso natural. A publicação pode ser acessada gratuitamente por este link https://bit.ly/3f8bL5F
Também fazem parte do projeto, como parceiros, o Ministério Público Federal (MPF – PRM/Dourados), o Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul (MPMS), Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-PTM/Dourados) e o Instituto de Meio Ambiente de Dourados (IMAM)/Prefeitura Municipal de Dourados.
Durante o período de um ano (10/12/2019 a 11/12/2020), 46 diferentes agrotóxicos e seus produtos de degradação, todos registrados no Brasil, foram monitorados. Os compostos selecionados nesse método foram estabelecidos com base no volume de comercialização de cada princípio ativo em Mato Grosso do Sul, uso nas culturas de soja, cana-de-açúcar e milho e a previsão legal dos valores máximos permitidos em agua superficial estabelecidos nas legislações estadual e federal.
De um total de 46 diferentes agrotóxicos e seus produtos de degradação considerados nesse estudo, encontrou-se 32 desses compostos em pelo menos uma amostra, resultando na frequência de ocorrência igual a 70% dos compostos analisados. Desses 32, apenas um possui (atrazina) tem os valores máximos permitidos em águas superficiais previstos na legislação.
Frequência de resíduos
De acordo com Scorza Júnior, “os compostos mais frequentes nas amostras analisadas foram a deetilatrazina (DEA), 2-hidroxiatrazina, atrazina, carbendazim, clorantraniliprole, clotianidina, epoxiconazole, hexazinona, imazetapir, imidacloprido, tebuconazole, tebutiurom e tiametoxam. As maiores concentrações encontradas dos resíduos de agrotóxicos nas amostras de água do Rio Dourados foram de atrazina (0,130 µg L-1), tiametoxam (0,077 µg L-1), 2-hidroxiatrazina (0,074 µg L-1) e imidacloprido (0,072 µg L-1).”
Dentre os agrotóxicos detectados, o cientista relata que apenas a atrazina (0,130 µg L-1) chegou mais próxima ao valor máximo permitido estabelecido na legislação brasileira, que é de 2,0 µg L-1. Dessa forma, os resíduos de atrazina encontra-se em conformidade legal.
O pesquisador explica que “os resultados servem como um diagnóstico do nível de exposição do Rio Dourados aos agrotóxicos utilizados nos principais sistemas de produção da região em estudo, fornecendo dados técnicos-científicos para aprimoramento de políticas públicas (por exemplo, inclusão de agrotóxicos não previstos na legislação brasileira que regula valores máximos permitidos desses compostos em águas superficiais) e para o processo de avaliação do risco ambiental de agrotóxicos pelas autoridades regulatórias, subsídio na definição de medidas mitigatórias para atenuação da problemática como o transporte dos agrotóxicos para as águas superficiais, entre outros.”
As ações mitigatórias para atenuar o problema podem ser, por exemplo, medidas para racionalização do uso de agrotóxicos nos sistemas de produção predominantes na BHRD, recomposição das matas ciliares nas margens do Rio Dourados, incentivo ao uso de insumos biológicos, entre outros.
Parceiros
Segundo Marco Antonio Delfino de Almeida, procurador do MPF, “o monitoramento é extremamente importante a qualquer atividade econômica que produza impactos ao meio ambiente. Via de regra ele acaba ocorrendo nos empreendimentos que a gente entende como de grande impacto e via de regra ele é feito pelos próprios empreendedores. Esse monitoramento da água do Rio Dourados é importante para que tenhamos a dimensão do impacto das atividades econômicas no meio ambiente e obviamente na saúde da população que se abastece desses recursos, justamente para que possam ser efetivados eventuais ajustes, bem como se atenda ao que é essencial igualmente que é o dever da informação à população sobre esses impactos. Um desdobramento decorrente desse monitoramento é a produção de dados e a consequente utilização, inclusive, na produção de artigos. O monitoramento acaba por ter dois relevantes: o papel de monitorar o impacto das atividades econômicas, informar a população e obviamente permitir que a sociedade se enriqueça com os dados científicos que são produzidos.”
Já Amilcar Araujo Carneiro Junior, promotor do MPMS, a parceria entre Embrapa Agropecuária Oeste e Ministérios Públicos resultou em um trabalho em que “agora se colhe o fruto que é este resultado de pesquisa e que nos faz chegar a algumas conclusões, já que antes não havia nenhum tipo de estudo. Agora, se tem a noção do que representa em termos de posição desses resíduos no Rio Dourados, que é uma das fontes de abastecimento da cidade. O que vamos fazer? Podemos usar esses dados coletados e fazer cruzamento com os dados que temos, com o CAR, por exemplo. É um ponto de partida para irmos para outros trabalhos. Sem esses dados da pesquisa não teria por onde começar”.
Para Luciano Furtado Loubet, promotor do MPMS, “é de extrema importância esse tipo de pesquisa, uma vez que há poucos dados sobre a presença de agrotóxicos no ambiente, especialmente em rios e córregos. Justamente por isto o MPMS apoiou a EMBRAPA neste projeto, pois, com base nele, podemos trazer o assunto à tona e cobrar das autoridades competentes providências. Vejam que a maioria dos produtos encontrados sequer possui legislação de volume máximo presente na natureza.”
Na visão do procurador do Trabalho Jeferson Pereira, “os resultados apontados no Boletim de Pesquisa e Desenvolvimento no que atine à análise dos resíduos de Agrotóxicos em águas do Rio Dourados/MS, corroboram agora de uma forma técnica, respaldada por uma metodologia científica, a identificação de uma considerável quantidade existente de diferentes compostos agrotóxicos, corroborando o que antes já era disseminado em termos de notícias veiculadas em nossa Região, quanto à essa contaminação das águas superficiais do Rio Dourados/MS. Não obstante restar apontado que um dos componentes químicos encontrados com maior frequência nas amostras não tenha ultrapassado o Valor Máximo Permitido disciplinado pela Resolução CONAMA nº 357 de 17/03/2005, os demais componentes químicos encontrados também nas águas do Rio Dourados não puderam ser avaliados em tal escala, justamente por não possuírem tal valoração na Legislação Brasileira, o que nos causa grande preocupação, sendo necessário, portanto, que referido estudo sirva de propulsão para que tais componentes sejam previstos e incluídos nessa escala de avaliação.”
E, de acordo com Rudolf Guimarães da Rocha, diretor-presidente do IMAM, “Pesquisas como esta são de extrema importância, pois servem como instrumento de investigação das consequências ocasionadas pelas ações antrópicas junto ao meio ambiente, fornecendo as informações necessárias para a gestão adequada dos nossos recursos hídricos. Os resultados obtidos nesta pesquisa são extremamente relevantes, pois ao mesmo tempo que nos passa a tranquilidade de se constatar que os parâmetros previstos na legislação vigente se encontram abaixo dos valores permitidos, por outro lado ressalta a necessidade de revisão das legislações brasileiras, com o intuito de se intensificar os estudos relacionados aos demais compostos encontrados durante a pesquisa.”