Por Viviane Taguchi
Motores são equipamentos que convertem energia elétrica em mecânica. Encarregados pelo consumo principal de energia em áreas rurais e agroindústria, eles oferecem vantagens e podem ser utilizados em muitos ambientes. São equipamentos flexíveis e versáteis e, devido aos diferentes níveis de voltagem, conseguem se ajustar a vários tipos de máquinas, auxiliando os profissionais do setor agrícola em suas atividades rotineiras, que vão desde a instalação e transporte de pessoas à versatilidade de utilização, como locomoção de máquinas fixas, limpeza, lavagens, geração de energia, bombeamento e força. Estas últimas tarefas são realizadas pelos motores estacionários ou motores de força, como são reconhecidos.
O motor estacionário é um modelo de combustão interna, cujo conjunto não se autodesloca. Seu eixo é acoplado à movimentação das máquinas e a sua principal característica é possuir rotações constantes durante o funcionamento. É utilizado para mover máquinas fixas como os geradores de energia, moinhos, estações de bombeamento, bombas e ferramentas de trabalho como roçadeiras, assopradores, veículos de deslocamento curto e embarcações. Podem ser de ciclo diesel, gasolina, motor dois tempos, quatro tempos ou a vapor.
O setor agrícola tem sido o segmento responsável, nos últimos anos, por retomar a movimentação no setor de motores de força, produtos que podem custar entre R$ 800 até R$ 40 mil, em média. Fabricantes apontam que o segmento é responsável por 60% a 70% das vendas. Em todas as atividades agrícolas, mas com diferentes focos de utilização, os clientes agrícolas puxaram essas vendas nos últimos anos, e mais fortemente, em 2020, com a pandemia.
“As pessoas precisaram se reinventar, o que levou a uma movimentação interessante: com o auxílio emergencial, por exemplo, muitos investiram em um negócio próprio, uma barraca de caldo de cana, que precisa de um motor estacionário, uma embarcação para transportar pessoas, que também precisa de um motor estacionário”, contou o diretor geral da Branco Motores, Juliano Silva. “O agronegócio empresarial não parou também”.
Silva ainda cita que muitas pessoas, na pandemia, adotaram um estilo de vida mais próximo à natureza, o que também movimentou o mercado. “Famílias decidiram sair das grandes metrópoles e foram morar em chácaras e sítios. E as ferramentas que uma propriedade rural demanda inclui motores estacionários, como as roçadeiras, trituradores, geradores”, emendou. O responsável pelas vendas de motores estacionários e geradores da Yanmar, Sérgio Scarton, também ressalta que 2020 ‘foi uma surpresa’. “No início da pandemia, achávamos que o mercado ficaria paralisado, mas a partir do mês de maio, houve uma retomada de negócios”, contou. A Yanmar é uma das líderes do setor e fornece produtos para as montadoras. “Foi uma surpresa muito positiva”, completa.
Mercados como os das regiões Norte e Nordeste foram os que mais puxaram as vendas de produtos estacionários no ano passado, mas o crescimento do setor foi sentido em todo o País. “Fazem parte da lista dos clientes para os motores estacionários de uma grande propriedade rural, com complexos sistemas de refrigeração, armazenamento, irrigação e processamento industrial até o ribeirinho, que utiliza o motor estacionário para transportar a sua família nas embarcações típicas da região e ralar a mandioca, ou o pequeno agricultor, que tem a sua horta”, explicou Alexandre Badra, supervisor de vendas de motores de força da Honda, uma das líderes do setor.
Alta demanda
A expectativa otimista do setor anda de mãos dadas com o crescimento do agronegócio. A safra de grãos, em 2021, deve totalizar 9 milhões de toneladas acima do volume da safra 2020, um crescimento de 3,5% em comparação ao ciclo anterior, que já tinha sido a maior desde os anos 1970, conforme informações do Levantamento Sistemático da Produção agrícola (LSPA) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E, para a temporada 2021/2022, a projeção é de alta, com preços elevados para as commodities. “Os preços estão bastante favoráveis no mercado internacional e a demanda continua em alta, por isso, os produtores seguem ampliando as áreas de plantio e os investimentos em infraestrutura continuarão em alta porque são necessários para a produção”, afirmou o gerente da pesquisa do IBGE, Carlos Barradas.
Ele afirma que o incremento de tecnologias nos equipamentos e o acesso aos mesmos, seja pelo auxílio emergencial ou microcrédito, também foi responsável pela alavancada do mercado. “O agricultor que antigamente utilizava uma enxada e hoje, tem a possibilidade de utilizar uma roçadeira, um furador e um triturador, não vai abrir mão disso porque são ferramentas que possibilitam a ele ter uma maior rentabilidade”, disse o pesquisador. “Saímos do mundo analógico para uma era tecnológica e mecanizada na agropecuária. Ainda que nem todos os brasileiros tenham acesso à digitalização, a mudança é significativa, constante e crescente”.
A expectativa dos fabricantes é que o setor continue bem aquecido neste ano. A média de crescimento deve ser de 20% em relação ao ano passado, segundo levantamento de desempenho setorial da Associação Brasileira da Indústria (ABI). Esse índice vem sendo registrado pelo setor de motores de força há pelo menos três anos. O relatório ainda aponta que, nos primeiros meses do ano, os fabricantes registraram queda, mas o segundo semestre registrou a reação.
Em 2020, o faturamento da Branco Motores, que tem sede em Araucária (PR), aumentou 50% em relação ao ano anterior e, para este ano, a expectativa é que o crescimento seja de 30%. “Foi uma surpresa porque, no início da pandemia, não sabíamos como o mercado iria reagir, mas passados os meses iniciais, houve uma movimentação muito forte”, explicou Juliano Silva, da Branco, reforçando as impressões do relatório. “O agronegócio em si vive um momento de muita prosperidade e consequentemente puxa muitos setores complementares”. A empresa já se prepara para lançar mais produtos no mercado e renovar até 30% do seu portifólio em 2021.
A MWM, de São Paulo, também estimou um crescimento positivo para este ano, no setor de motores de força. Segundo o CEO da companhia, José Eduardo Luzzi, a expectativa é que em 2021, a empresa cresça 35% em relação ao ano passado, que foi um ano atípico devido à pandemia. Em 2020, a MWM teve queda na produção, mas registrou alta de 4% nas vendas. Para este ano, a meta é vender mais de 30 mil unidades.
A Yanmar, também projeta um ano otimista: em 2020, a empresa, de origem japonesa, instalada em Indaiatuba (SP), aumentou em 50% do seu faturamento no ano 2020/2021, encerrado em abril, e espera crescer 30% a 40% em 2021/2022. Com uma produção globalizada, todos os componentes da empresa são importados da Yanmar/Japão. “A pandemia encareceu a logística (dos navios cargueiros) e o frete, que girava em torno de US$ 1 mil/contêniner, hoje está em torno de US$ 4 mil/contêiner”, disse Scarton. Para chegar ao Brasil, essas peças levam em torno de cinco meses. Em 2020, a Yanmar também aumentou a família de motores estacionários com pelo menos duas linhas novas e, por enquanto, a novidade vai ficar para 2022, com produtos de maior potência, que foi lançada recentemente no Japão.
Sem feiras
Para driblar a suspensão das feiras do setor, como Agrishow, Bahia Farm Show, Feacoop, entre outras, a Branco Motores apostou em tecnologias digitais para se aproximar dos clientes e revendas. “Criamos opções para nos aproximar dos clientes, mas neste setor nada substitui a interação pessoal. Na feira, as pessoas podem testar, pegar e manusear os equipamentos. As alternativas digitais mitigam, mas não substituem o contato presencial”, afirmou Juliano Silva. “O impacto financeiro (da suspensão temporária das feiras agrícolas) não mudou em nada, mas o que foi sentido foi a falta dessa aproximação direta com o consumidor”, reforçou a gerente de marketing da Branco, Mayara Amaral.
Ela conta que uma das inovações da companhia foi desenvolver uma plataforma digital voltada para o setor varejista. “Quem está tendo contato com os consumidores são as redes varejistas, ainda que obedecendo aos horários de isolamento social e medidas de segurança. Então, criamos uma plataforma interativa e educativa para que eles possam auxiliar esse consumidor”, contou. “Acontece, muitas vezes, de unirmos o atendimento digital e presencial com essa plataforma”.
Para a Yanmar, cujo modelo de negócios não é voltado ao consumidor final e, sim, às fábricas, a suspensão das feiras não interferiu. “Realizamos workshop, intensificamos o contato virtual e telefônico com os nossos clientes para dar suporte e gerar novos negócios”, afirmou Scarton. “As feiras não são o foco da Yanmar, mas podem sim gerar grandes negócios: em uma semana é possível gerar negócios que normalmente levariam quatro meses”. A companhia também realizou um Feirão On-line.
Pequenos e médios
A movimentação no setor nos últimos meses tem sido atribuída à pujança do agronegócio, mas principalmente, aos pequenos e médios produtores rurais. “Em todos os setores da agricultura, houve a mecanização e a entrada de motores estacionários como o primeiro avanço tecnológico nas propriedades”, afirmou Silva, da Branco. “A agricultura familiar deixou de ser de subsistência para se tornar uma atividade econômica para aquela família principalmente na pandemia, período em que o consumidor também passou a demandar uma alimentação mais saudável, pois passou a preparar o alimento em casa, estava preocupado com a saúde”, complementou Barradas. “Hoje temos inúmeros produtores de alimentos orgânicos, é um setor em franco crescimento e que também demanda os motores estacionários para desenvolver a atividade”.
Em pequenas e médias propriedades rurais, os motores estacionários mostram a sua versatilidade: eles são utilizados em embarcações, veículos de transporte pequenos e artesanais, roçadeiras, trituradores de galhos, assopradores, arados, furadores, cortadores de grama, geradores de pequeno porte. Com as inovações tecnológicas embutidas, hoje é possível encontrar equipamentos que aram áreas em desnível, implementos desenvolvidos para cada cultura e suas demandas específicas. “Hoje em dia, a indústria também pensa em questões como conforto para o usuário, ergonomia e saúde”, afirmou Silva. “Levamos tudo isso em consideração na hora de desenvolver um equipamento. É para facilitar a rotina do agricultor e a sua rentabilidade”.
Grandes fazendas
As demandas para motores estacionários mudam um pouco quando o cliente é um grupo agrícola ou uma agroindústria, garantem os executivos do setor. Nessa área, o que mais tem puxado as vendas de motores estacionários é a demanda por energia elétrica, ou seja, os geradores de energia.
A energia elétrica é um dos itens que mais interferem no orçamento do processo do setor agropecuário e, sem ela, toda a cadeia produtiva de alimentos ficaria comprometida. A sua falta, oscilações e falhas no fornecimento impactam desde a produção, armazenamento, logística até a estrutura de uma agroindústria. “A energia elétrica é fundamental para manter sistemas de irrigação de lavouras de qualquer porte, a ordenha mecânica das fazendas leiteiras, a refrigeração e a climatização adequadas à produção de inúmeros itens como frutas, leite, aviários, galpões de vacas leiteiras e do processamento da produção de grãos ao seu escoamento”, exemplificou Scarton, da Yanmar, que fornece motores para refrigeração de caminhões. “A cadeia de alimentos não pode ficar sem a refrigeração”.
As grandes propriedades rurais demandam equipamentos como geradores de energia que podem ser utilizados como suporte da produção, como fonte única de abastecimento ou complementar à rede. Silva, da Branco, lembra ainda que, mesmo em realidades diferentes, a demanda por energia elétrica é constante.
No Brasil, as oscilações de energia elétrica podem ocorrer por falta de abastecimento ou logística e investimentos em infraestrutura, mas em países como os Estados Unidos, por exemplo, a energia elétrica pode faltar por intercorrências naturais como nevascas, tempestades ou tornados. “No ano passado, em Santa Catarina, tivemos a ocorrência de um tornado e foi um acontecimento que também alavancou as vendas de geradores naquela região”, disse Mayara. “Mais recentemente, um incêndio em uma estação em São Paulo, atingiu inúmeras granjas no seu entorno. O aumento da temperatura nos galpões causou um grande prejuízo com a morte de milhares de aves, porque faltava um gerador para manter a temperatura ambiente adequada para os animais”.
De acordo com o Sistema Interligado Nacional (SIN), ainda existem no país duas cidades, no Acre, com população superior a 20 mil habitantes que não estão ligadas ao sistema nacional e, portanto, não possuem energia de concessionárias. Para abastecer as duas cidades, foram instalados 12 geradores de 550 kVA, de acordo com o SIN.
Demanda urbana
Não é só no campo que os geradores de energia são essenciais e a necessidade de ter energia elétrica de forma ininterrupta atinge toda a sociedade. Da residência de uma família a um hospital, que precisa manter todo o sistema funcionando sem falhas, ao supermercado, que necessita manter todos os alimentos bem conservados. Investir em um equipamento, segundo especialistas em energia, é sinônimo de reduzir a dependência do fornecimento das concessionárias e só este motivo já valeria o investimento.
De acordo com o IBGE, 86% dos consumidores, residenciais e comerciais, utilizam exclusivamente a energia produzida a partir de hidrelétricas e distribuída através das concessionárias. Ao mesmo tempo em que a rede nacional tem capilaridade e robustez, também tem um histórico de falhas e instabilidade, como ocorreu no Amapá no final do ano passado, quando a população ficou 22 dias sem fornecimento de energia, e mais recentemente, neste mês de abril, quando pelo menos 15 municípios ficaram novamente sem energia por pelo menos 16 horas. O apagão teria ocorrido porque uma estação em Macapá pegou fogo e não havia, ali, geradores para complementar o abastecimento, segundo a Linhas de Macapá Transmissores de Energia (LMTE). O Coletivo Nacional dos Eletricitários estimou que o prejuízo no Estado superou os R$ 200 milhões.
Em grandes metrópoles, mais recentemente, é a legislação que vem impulsionando a obrigatoriedade do investimento em geradores. Em São Paulo, por exemplo, um projeto de lei que tramita na Assembleia Legislativa do Estado prevê a obrigatoriedade de prédios comerciais e residenciais terem grupos geradores. A lei diz que o auto de vistoria do Corpo de Bombeiros somente poderá ser aprovado se o imóvel possuir gerador de energia, em prédios comerciais com mais de 60 metros de altura e edifícios residenciais com mais de 80 metros de altura. Em Goiânia, a obrigatoriedade de geradores vale para edifícios públicos e privados construídos a partir de 2016. O mesmo vale para hospitais, que são obrigados a possuir grupos de geradores para não correr o risco de faltar energia.
Os fabricantes de geradores explicam que há equipamentos com diferentes tipos de combustíveis – óleo diesel, gasolina ou gás natural – e a variação da potência vai de 25 kVA a 1500 kVA e de regimes de funcionamento (constante ou em período determinado). Tamanhos e dimensões são diversificados e dependem da demanda. Os preços praticados no mercado costumam variar entre R$ 450 a R$ 50 mil.