Nova geração influencia na gestão das propriedades

Participação de filhos de produtores na gestão das propriedades altera estratégias e vendas do setor

Por Gustavo Paes

O jovem Gláucio Thiago Moraes, de 37 anos, é produtor de soja, milho e sorgo nas fazendas Campina e Recanto Alegre, localizadas em Terenos (MS). Engenheiro agrônomo por formação, ele herdou a agricultura do seu pai, Arão Antônio Moraes, 72, que sempre o incentivou a participar do negócio da família e o fez assumir parte da lavoura, ainda enquanto estudante, até criar seu próprio espaço na produção de grãos. “Há uns quatro ou cinco anos, o pai incentivou que eu assumisse a gestão das lavouras”, afirma Gláucio. 

Nas duas propriedades, que totalizam 5.870 hectares, a família Moraes cultiva soja durante o verão e milho no inverno. A produção é entregue as empresas ADM do Brasil e Cargill, de Campo Grande (MS). E, em uma área vizinha, eles plantam outros 3,4 mil hectares de milho safrinha e 1 mil hectares de sorgo. Os grãos são usados na fabricação de ração, que serve de alimentação para 3,5 mil matrizes de ciclo completo (cerca de 45 mil suínos), atividade que é administrada pela irmã mais velha de Gláucio, Tereza, 44. 

Gláucio, que em 2004 se formou em Agronomia na Universidade Anhanguera Uniderp, de Campo Grande (MS), é quem decide a hora de renovação do maquinário, mas não deixa de ouvir o pai e a mãe Jussara, 61 anos, que é quem controla as finanças. “Eu sempre ouço a opinião dos meus pais, mas sou a pessoa mais indicada para decidir pela compra das máquinas, já que faço a gestão das lavouras e sei do que é preciso para melhorar a nossa produtividade e reduzir os custos de produção”, diz o engenheiro agrônomo. 

Clientes da New Holland, do Grupo CNH, nos últimos anos eles compraram três pulverizadores SP 2500, três colhedoras CR 680 e outras três do modelo TC5090. E também adquiriram dois tratores de alta potência T7, aumentando a frota desse equipamento para 18 unidades. Os tratores T7 contam com uma nova barra de tração classe 3, que suporta os maiores implementos disponíveis no mercado para a sua categoria. E ganharam uma nova bomba hidráulica que aumentou o fluxo de 151 litros por minuto para 180 litros por minuto. A nova configuração permite mais agilidade em operações com implementos que demandem vazão maior.

Gláucio diz que, com a aquisição das novas máquinas, eles inseriram tecnologia na fazenda. Os equipamentos primeiro receberam GPS e, depois, piloto automático. Na sequência, os produtores passaram a fazer pulverização com controle bico a bico, mapas de plantio, marcação de linhas de plantio, uso da telemetria e taxa variável de fertilizantes. “Reduzimos o custo de sementes e fertilizantes com a otimização do uso e ainda aumentamos a produtividade, principalmente por conseguir plantar e colher em um período mais curto, dentro da janela ideal”, completa.   

Exportação de grãos

Em 2007, o agricultor Ernst Ferter entregou a administração dos negócios para os filhos Peter e Robert. Os dois cuidam de três fazendas em Dourados (MS), onde cultivam soja, milho e trigo em uma área de aproximadamente 16 mil hectares, entre terras próprias e arrendadas. Na principal delas, a Fazenda Paraíso, de 12,3 mil hectares (10,2 mil hectares próprios), durante o verão eles cultivam toda a área com soja e depois com milho safrinha. No inverno, a oleaginosa dá lugar ao trigo. 

Cláucio Thiago Moraes, produtor de soja, milho e sorgo, com sua família, em Dourados (MS)

A produção é exportada e também comercializada no mercado interno, conforme Peter, que é sócio da FV Cereais, empresa que administra portos no município de Porto Murtinho (MS), localizado na Região Sudoeste do estado. 

As três fazendas contam com um grande número de máquinas. Na última safra foram usadas 20 colhedoras, 15 tratores de grande porte (acima de 300 cv), nove tratores na faixa de 180 a 200 cv e outros cinco tratores de 70 cv, além de cinco pulverizadores autopropelidos com barras de aplicação de 30 metros, duas adubadoras a lanço autopropelidas e um avião agrícola Air Tractor. 

A frota é renovada a cada oito anos. “Nós trocamos todo o maquinário em, no máximo oito anos, porque precisamos de máquinas novas, funcionando perfeitamente”, afirma o empresário. Ele explica que as janelas de plantio e colheita estão cada vez mais curtas e não pode perder um dia sequer com máquinas paradas na lavoura. “Nossa meta é estar com toda a safra de soja plantada entre os dias 15 e 20 de outubro e, em fevereiro, com 100% da área plantada e colhida com o milho”, adianta Peter, que é natural de Guarapuava (PR).

O empresário, de 49 anos, conta que todas as decisões são tomadas em família. Mesmo afastado da administração dos negócios, Ernst, hoje com 80 anos, ainda participa das reuniões. “Ele ainda anda pelas propriedades, mas no ritmo dele. Hoje o pai está aproveitando a vida, tomando uma cerveja”, conta Peter.

Jovens de opinião

A crescente importância da agricultura no Brasil em função dos mercados globalizados impõe às empresas rurais uma constante redução de custos operacionais, aumento da produtividade e racionalidade nos investimentos em busca de uma melhor rentabilidade, o que requer maior assertividade na tomada de decisões. Em função dos investimentos em máquinas e implementos agrícolas serem em grande parte vultuosos, o produtor precisa reduzir os riscos. 

Uma pesquisa realizada pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) junto aos compradores de máquinas agrícolas mostrou que a confiança na marca do maquinário é o atributo com maior peso para a maioria dos agricultores brasileiros. A facilidade operacional, a recomendação técnica e o valor de revenda são outros atributos considerados na hora de renovar o maquinário, conforme o estudo, conduzido em 52 empresas rurais do Rio Grande do Sul.

O acesso dos jovens às novas tecnologias facilita a busca por informações sobre os produtos. Usando celulares e tablets com acesso à internet, os agricultores recorrem às redes sociais – como Facebook e Instagram – e a aplicativos, especialmente o WhatsApp, para buscar referências de outros compradores de máquinas e implementos sobre o produto. Eles também utilizam a web para procurar informações no site do fabricante e participam de demonstrações e dias de campo promovidos pelos fabricantes.

Assim, os jovens, que já cresceram na era digital e usam com desenvoltura as ferramentas digitais, influenciam cada vez mais na hora de comprar uma nova máquina agrícola. Eles saem da faculdade com o diploma e novas ideias na cabeça para implantar nas propriedades que um dia serão deles, pela sucessão familiar.

Tecnologia no campo 

De acordo com uma estimativa da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), cerca de 40% dos produtores rurais deverão deixar de atuar nas atividades até 2030. Já o Censo Agropecuário 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostrou que um, a cada quatro produtor rural tem mais de 65 anos.

Um dos motivos que leva ao problema é que, muitas vezes, os filhos dos produtores rurais não se sentem motivados com o negócio da família e acabam se mudando para as grandes cidades, em busca de melhores salários e qualidade de vida. Os dados do IBGE revelam que apenas 30% das empresas familiares chegam na segunda geração, e só 5% conseguem resistir até a terceira.

Jovens que já cresceram na era digital

Essa situação só pode ser mudada com investimento em tecnologia, conforme Bernardo Fabiani, diretor-geral da TerraMagna, agfintech de São José dos Campos (SP) que facilita a concessão de crédito no agronegócio. “O campo tem que ser um lugar de pesquisa e adesão a novas tecnologias”, afirma o executivo. Ele cita o exemplo de software de gestão da propriedade, uso de inteligência artificial e monitoramento via satélite para manter os jovens no campo. “Essas tecnologias tornam o negócio da família mais atraente, facilitando a sucessão familiar”, completa Fabiani. 

Aumento da produtividade

Hoje, o meio rural tem uma internet – ainda que precária – e atrai mais os jovens, que saem da faculdade e voltam para trabalhar no campo, diz o presidente do Sindicato das Indústrias de Máquinas e Implementos Agrícolas do Rio Grande do Sul (Simers), Claudio Bier. “Os jovens convencem os pais a investir em máquinas com maior tecnologia, pensando no aumento da produtividade, em maior qualidade”, salienta.

O dirigente diz que os jovens estão mais familiarizados com os novos equipamentos da Agricultura 4.0. “A tecnologia embarcada aumentou muito nos últimos anos. Hoje em dia, uma colhedora vai trabalhando e fazendo mapa da colheita e indicando onde é preciso aplicar mais insumos. E até mesmo tratores de pequeno porte têm seis computadores. A gurizada é que conhece e sabe operar essas máquinas”, destaca Bier. 

O produtor rural investe na aquisição de maquinário para reduzir custos e ser mais eficiente, segundo o dirigente. “As janelas de plantio e colheita estão cada vez menores e o produtor rural precisa de um equipamento para realizar a operação em menor tempo” lembra o presidente do Simers, acrescentando que perdas nas lavouras é coisa do passado. “Hoje em dia ninguém mais fala em perda de grãos”, completa o dirigente.  

Gestão na palma da mão

O diretor de Marketing da montadora sul-coreana LS Tractor, Astor Ricardo Kilpp, confirma que jovens estão influenciando mais na compra de novas máquinas. Seja na aquisição de um trator de pequeno porte equipado com cabine, para proporcionar mais segurança e conforto ao pai que opera o equipamento, como no processo de gestão das propriedades de maior porte. “O jovem não quer mais passar o dia inteiro na lavoura como o pai fazia, mas exige ter a gestão da propriedade na palma da mão”, declara o executivo. 

Kilpp lembra que os avanços tecnológicos em máquinas e equipamentos implantados no campo contribuíram para o aumento da produção, melhoria na renda e qualidade de vida do produtor brasileiro. 

“A agricultura tem se modernizado, especialmente com a implantação das tecnologias de ponta nos maquinários usados na plantação e colheita, utilizando modernos tratores, colhedoras e semeadoras equipadas com aparelhos GPS que mapeiam o terreno e toda a área a ser plantada, permitindo aos agricultores um aumento na produção e redução de desperdícios de sementes”, acrescenta Kilpp.

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