Máquinas e Inovações Agrícolas

Inflação e câmbio podem barrar crescimento do agronegócio

Por Adriana Gavaça

 

 

A agropecuária foi o único setor que conseguiu driblar a crise provocada pela pandemia da Covid-19 e crescer em 2020. Enquanto a economia brasileira encolheu 4,1%, no ano passado – o pior resultado de um ano fechado do PIB em toda a série histórica do IBGE, que começa em 1996 – o agro registrou aumento de 2%, em igual período.

Apesar do bom resultado, especialistas que estão à frente de entidades ligadas ao agronegócio enxergam que é possível avançar mais. Para isso, listam uma série de desafios que o setor terá de enfrentar a curto e médio prazos, como volatilidade cambial, volta da inflação e infraestrutura precária, por exemplo, para o Brasil se consolidar como principal produtor e exportador de alimentos mundial.

Acompanhe!

Renato Conchon – Coordenador do Núcleo Econômico da CNA

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), acredita que o PIB da agropecuária deverá crescer 2,5% em 2021. Esse resultado deve ser atribuído a boa safra de grãos que vai se concretizando. A safra verão apresenta bom desenvolvimento das principais culturas (soja e milho), embora tenha havido atraso no plantio e na colheita. Nossa expectativa para a segunda safra é que nem todo milho safrinha será plantado no tempo ideal, aproximadamente 1/3 da safrinha será plantada fora da janela ideal, o que pode comprometer a produtividade e a produção, influenciando em uma possível queda do PIB agro para 2021, mas ainda não temos cenário claro que haverá queda.

Retração

Na última década, o PIB da agropecuária apresentou crescimento de 25,4%, enquanto o PIB Brasil apresentou retração de 1,2%. Essa queda se deve ao fato de não haver políticas públicas que promovessem a ampliação da produtividade na economia na última década.

Para o agro, essas políticas foram criadas e se apresentaram condizentes com as necessidades naquele momento. Ocorre que agora o setor precisa de uma nova etapa para promover ainda mais esse crescimento. Para essa nova etapa, precisamos avançar na questão logística, embora é meritório dizer que muito evoluiu, nos últimos anos, propostas como a BR do Mar, BR dos Rios, e que irão impulsionar o escoamento da safra com custos menores.

Financiamento

Em outra frente, precisamos impulsionar o financiamento da atividade agropecuária por outras fontes, uma vez que os recursos públicos estão, ano após ano, sendo reduzidos. Para isso, a proposta do FIAGRO deve melhorar o ambiente para os fomentadores de crédito.

A reforma tributária também é imprescindível para reduzir a insegurança jurídica. Mas, diante do cenário fiscal que vivemos atualmente, é um risco que uma reforma amplie ainda mais a carga tributária, e isso é o que a sociedade brasileira menos precisa no momento.

Antonio da Luz – Economista-chefe da Farsul

O mais relevante não é nem o resultado do PIB brasileiro de 2020, de queda de 4,1%. O que mais me chama atenção é o resultado da década. Quando fechamos o decênio, percebemos que foi uma década literalmente perdida. A taxa média de crescimento da economia brasileira foi de apenas 0,3%. Ou seja, se nós achávamos que a década de 80 foi ruim, essa última década foi muito pior, onde o Brasil estacionou mesmo.

Entretanto, isso não se verifica no agro. No agro, a realidade é completamente diferente. Nós crescemos a taxa de país emergente, que é exatamente o que nós somos. Se o país não faz aquilo que se espera, não faz aquilo que se imagina que um país emergente possa fazer, no agro nós fazemos. Nós estamos mantendo um padrão internacional de crescimento.

Para o agro, foi uma década em que crescemos bastante. Foi uma década que nos desenvolvemos bastante, que agregamos muita tecnologia e, sem dúvida, o setor de máquinas agrícolas foi determinante para esse resultado. Seja pela produtividade, que cresce na agropecuária a partir da mecanização, a partir da transferência da tecnologia do setor industrial para o setor agrícola, quando se utiliza maior nível de mecanização; seja pelo próprio PIB, que agrega dentro do segmento do agronegócio.

Previsão

É absolutamente possível crescer mais em 2021 do que crescemos em 2020. Eu diria até que provável que iremos crescer mais em 2021. Afinal de contas tivemos em 2020, no Rio Grande do Sul, por exemplo, um clima péssimo. O Rio grande do Sul que é o terceiro em produção de grãos no Brasil teve uma das piores estiagens da história. Resultado esse que não deve se repetir em 2021. Estamos bastante confiantes que não só a safra gaúcha, mas a safra brasileira em todos os seus estados, deve ter um bom desempenho e que, vendido a preços superiores, deve trazer um resultado maior para a agropecuária e, por consequência, para o PIB como um todo.

Gargalos

Temos ainda muitos desafios a vencer. Hoje um dos grandes gargalos está na infraestrutura. Temos visto uma melhora no setor de infraestrutura brasileira, mas as de melhoria são pífias perto da necessidade de crescimento que o Brasil rural do mundo agro necessita. Precisaríamos de taxas de evolução muito mais importantes do que essas que vemos, para poder dar conta de uma safra que cresce, não raro, acima de dois dígitos.

A volatilidade cambial também pode ser vista como gargalo. Quem garante o nosso custo de produção na próxima safra? De quanto será o custo de manutenção? Qual será o custo de reposição de máquinas, de peças etc? O câmbio parece muito bonito quando ele sobe e com ele o valor de produção. E o preço do custo, como é que fica? Será que no final desse ciclo de alta do câmbio não vamos ficar apenas com inflação como resultado? Afinal de contas sobe o preço, mas também sobe o custo. São questões que nós temos que observar.

O baixo crescimento econômico também traz como gargalo o mau desempenho do mercado doméstico de consumo de alimentos. Isso pra nós também é um problema. É verdade que chegamos com nossos produtos em duas centenas de países e regiões, mas também é verdade que nosso principal consumidor é o interno. E esse é um consumidor que vem arroxado de um crescimento de 0,3% ao ano em uma década. Não dá para exigir muito dele depois de um tombo de 4,1%, como aconteceu no ano passado. Então o consumo interno eu diria que é um outro gargalo.

Entrando em um gargalo bastante familiar ao setor de máquinas agrícolas, está a ausência de crédito. O crédito rural tal qual nós conhecemos, baseado com funding BNDES, equalização do tesouro, essas coisas todas, nos ajudaram a chegar até aqui e nós somos muito gratos. Entendemos a importância desses mecanismos, eles foram muito bons, continuam sendo bons, mas são absolutamente insuficientes para atender à demanda. Seja dos produtores rurais para comprar, para fazer seus investimentos, seja do setor de máquinas agrícolas para vender. O sistema de crédito precisa se renovar, ter outras alternativas. Os setores, tanto produtores quanto indústrias, precisam olhar com mais atenção para operações estruturadas de crédito, se informar melhor sobre isso, entender de que forma elas podem ajudar no seu negócio.

E, por fim, tem ainda a ausência de matéria prima que está criando um apagão nas peças de reposição e, por consequência, também na montagem de novos equipamentos.

Pedro Estevão Bastos – presidente CSMIA da Abimaq

No ano passado, tivemos uma ótima safra agrícola, as exportações do agronegócio bateram recordes e a valorização do dólar em 30% propiciaram uma grande rentabilidade para os agricultores das culturas de exportação como soja, milho, café, algodão, laranja, celulose e carnes.

O setor é muito dinâmico e é influenciado por variáveis incontroláveis como a safra agrícola dos hemisférios norte e sul que se colhe em épocas distintas; o câmbio que pode determinar a rentabilidade das lavouras; o clima imponderável; e as questões internas de crédito agrícola. Essas questões são conjunturais apesar de ter a capacidade de alterar os rumos dos resultados em determinado ano. Sobre fatores estruturais, o agronegócio está bem capacitado e com ótimas perspectivas para o médio e longo prazos.

Perspectivas

O Brasil se tornou um grande fornecedor de alimentos para o mundo, principalmente para Ásia onde as áreas aráveis para cultivo estão em grande parte tomadas. No entanto, a população cresce numericamente e aumenta sua renda, demandando alimentos e o Brasil prossegue como um dos grandes fornecedores desse mercado. Baseada nessa conjuntura, a previsão para o próximo ano é de um crescimento real de 3% (descontada a inflação) e nominal de 10% nas vendas, chegando a R$ 21,9 bilhões de faturamento.

Cláudio Bier – Presidente do Simers/RS

Observando os dados do IBGE, nós da indústria de máquinas e implementos agrícolas, percebemos que este crescimento vai acontecer em 2021, pelo número de pedidos que chegam às indústrias.

A expectativa é boa mas estamos apreensivos, pois os insumos e produtos primários para fabricação de máquinas estão escassos e muito caros no mercado. Um exemplo disso é o aço, no ano de 2020 aumentou o valor em 80%, e neste ano já aumentou 38%.

Os números mostram que teremos uma supersafra de grãos e para a indústria é uma ótima notícia tendo em vista que os produtores terão dinheiro para investimento na sua lavoura.

Plano Safra

O que se observou nos últimos Planos Safra é que os juros estão superiores ao esperado e os valores disponibilizados para linhas de crédito terminam antes do final do ano, sendo que até o próximo Plano Safra fica uma lacuna de, no mínimo, cinco meses, em que o agricultor deixa de comprar maquinário para sua próxima colheita e até plantação, e, consequentemente estagnando o sistema do agronegócio.

Sempre fizemos pedidos aos ministros de agricultura e até mesmo ao próprio presidente da República para aumentar os valores a serem disponibilizados para o Plano Safra. Pois, o agricultor tem interesse em investir comprando máquinas e equipamentos de ótima tecnologia para sua lavoura render e, assim, lucrar mais.

 

 

 

 

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