Por Joel S. Alves *
Máquinas, motores, eixos de transferências de forças, redutores, engrenagens, acoplamentos e dispositivos rodantes, entre outros variados itens. Eis um universo cada vez mais frequente no meio agrícola, desde uma grande organização do agronegócio até a pequena propriedade familiar. Como sabemos, a mecanização ao longo do tempo tornou-se essencial para fazer frente ao aumento da população urbana em todo o mundo, aumentar a produtividade no campo e garantir a sustentabilidade num mundo que demanda cada vez mais alimentos de qualidade.
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Para que desempenhem a atividade para a qual foram projetadas e produzidas, obviamente, as máquinas precisam de manutenções periódicas. Ah, esse porém… A norma NBR-5462, da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT ), dá-nos o conceito para o desempenho correto: Mantenabilidade. O nome é um pouco complicado, mas corresponde à “capacidade de um item atender as funções requeridas (especificadas), após manutenção regida por procedimento escrito”.
O primeiro passo é ter procedimentos escritos para desencadear os serviços de manutenção a serem executados em tempos também determinados. Colocado dessa maneira, parece simples, porém, lamento observar o quanto essa providência é negligenciada na prática. Revisões periódicas? Parar máquinas para executar serviços? Se está funcionando pra que parar? “Mete bronca, porque precisamos produzir”. É isso que acontece na real. E a manutenção? Oras, a manutenção…
Prevenir ou corrigir
A manutenção pode ser preventiva ou corretiva. A primeira refere-se a todos os serviços de inspeções sistemáticas, ajustes, conservação e eliminação de defeitos, visando evitar falhas ou defeitos. Já a manutenção corretiva, como o próprio nome indica, corresponde a todo e qualquer reparo feito no equipamento com falha.
Parece fácil de entender, mas difícil de praticar. Não deveria ser assim, afinal é evidente que a manutenção corretiva apresenta custos elevados, pois, além do maior tempo de parada do equipamento, implica gastos significativos com peças de reposição. Já a manutenção preventiva, essa sim, representa menores custos com material e serviços, bastando apenas planejamento para determinar os períodos de parada para execução dos serviços. Simples? Sim, mas ainda estamos longe dessa realidade, principalmente entre pequenos e médios produtores. Os grandes já se deram conta desses simples e vantajosos procedimentos, por isso, já estão adotando-os.
E que procedimentos devem ser seguidos? Enumeremos a seguir alguns deles, para termos um mínimo referencial ao elaborar um planejamento mais específico, que seria o plano (tabela ou ficha) de manutenção preventiva da máquina. Acompanhe:
1 – Fluidos: todos os fluidos líquidos e gasosos de uma máquina requerem revisões sistemáticas, principalmente em climas úmidos e com variações elevadas de temperatura e pressão, pois se contaminam facilmente em tais condições. Então, devemos incluir na verificação: lubrificantes de todos os conjuntos mecânicos (desde o motor até a transmissão e redutores finais), líquidos de arrefecimento, fluidos hidráulicos, fluidos pneumáticos (o ar) e combustível;
2 – Filtros: Todos os fluidos requerem filtros para se manterem o mais limpo possível. Muita limpeza e substituição a fazer.
3 – Vedações: Elementos de vedação são destinados a proteger máquinas ou equipamentos contra a saída de líquidos e gases, e a entrada de sujeira ou pó. São genericamente conhecidas como juntas, retentores, selos, gaxetas e guarnições. As partes a serem vedadas podem estar em repouso ou movimento. Em função da solicitação, as vedações são feitas em diversos formatos e diferentes materiais.
4 – Dispositivos de fixação: Parafusos, porcas e arruelas são peças metálicas de vital importância como elementos de fixação dos mais diversos dispositivos de uma máquina. São empregados para unir e manter juntas as peças da máquina. E haja chave e torquímetro para efetuar a verificação.
A partir destes quatro parâmetros é possível estruturar um plano de manutenção preventivo específico para cada máquina. Os serviços de manutenção preventiva devem ser planejados e programados: todas as etapas dos serviços a serem executados devem estar bem definidos, levando-se em consideração, material e mão de obra necessária. É bom lembrar que os fabricantes de máquinas fornecem junto com os manuais de operação um plano básico de manutenção preventiva, que pode e deve ser aperfeiçoado pelo proprietário, de acordo com sua realidade. O referencial de controle para elaboração das planilhas é o número de horas trabalhadas pela máquina, e o horímetro é o instrumento a ser verificado e controlado diariamente.
Portanto, os serviços de manutenção preventiva variam conforme o tipo de máquina, local de trabalho e tipo de operação e equipamentos. Mas, tomando-se por base um trator agrícola, podemos sugerir um referencial mínimo. É bom lembrar que a inspeção diária, que deve ser realizada pelo operador, faz parte da manutenção preventiva, embora não sejam contemplados neste artigo já que foi abordado em outra edição recente da revista. Partimos das 50 horas ou semanais, depois 250 ou 300 horas, 500 horas, e por fim 1000 horas. Então, vamos a um exemplo:
Dependendo das condições de trabalho, do fabricante e do tipo de máquina, alguns itens ainda devem ser realizados com 2000h, 3000h ou 5000h. Entre esses itens estão regulagem de válvulas do motor, limpeza e teste dos bicos injetores, revisão geral no sistema de acoplamento de 3 pontos, inspeção e lubrificação dos rolamentos das pontas de eixo. São serviços que demandam maior tempo para execução e que comportam certa flexibilidade nos intervalos de horas trabalhadas, mas que não podem ser esquecidos – devem ser contemplados conforme a necessidade.
Vantagens e desvantagens
As principais vantagens da manutenção preventiva são reduzir o envelhecimento ou a degeneração dos equipamentos, a garantia de um melhor estado técnico operacional dos equipamentos, a atuação antes de os problemas aparecerem (evitando ações corretivas que geram altos custos), a realização dos serviços em melhores condições para a operação e a possibilidade de programar as intervenções.
A dificuldade quase sempre é a falta de tempo para a parada da máquina, pois, por melhor que seja a programação, sempre haverá interrupção do trabalho do equipamento. Sabemos que máquina parada é perda de produção e lucratividade. Mas e se não pararmos para a manutenção preventiva? Certamente, em algum momento ele vai parar para a corretiva – mais dispendiosa, demorada, com consumo de peças e mais custos. De fato, a preventiva exige tempo para ser executada corretamente, não é chegar na oficina para uma preventiva rápida, como muitos pensam.
Em muitas situações nas quais tive a oportunidade de debater questões operacionais e de manutenção com empresários do setor me defrontei com a seguinte questão: o foco da empresa não é máquinas e equipamentos, os quais são apenas ferramentas para viabilizar o negócio. Pois é! E agora? Mesmo não sendo economista, arrisco retrucar: será que o negócio está com lucros tão bons a tal ponto de se dar ao luxo de gastar mais com a manutenção corretiva, ou até com o sucateamento rápido do maquinário (fato que já presenciei!) em vez de poupar dinheiro fazendo prevenção?
Oficina e qualificação
Para correta execução do plano de manutenção preventiva é necessário local adequado, uma oficina com espaço suficiente para atender a demanda do número de máquinas que deverão entrar em serviço, ferramentas e equipamentos para a execução das tarefas, e pessoas treinadas e qualificadas. Eis aí um grande problema no momento. Treinar equipes de trabalho na área técnica-operacional ainda não é uma prioridade em nossa realidade. Não possuímos um ambiente cultural favorável para que floresçam pessoas em quantidade suficiente para tais equipes. Lamento constatar, mas essa é uma realidade por demais palpável. Em muitas empresas nas quais realizo treinamento, sou solicitado a indicar alguém que tenha condições para trabalhar em equipes de manutenção. Talvez aí esteja um dos motivos adicionais pelos quais muitos empresários abortam os necessários procedimentos.
No aspecto da capacitação temos dois universos: a formação profissionalizante e a técnica. E elas estão? Devagar, quase parando. Explicamos, de uma forma sucinta, pois o assunto é longo, mas o que ocorre é o seguinte: os egressos dos cursos técnicos, em grande maioria, seguem para cursos superiores. Seria essa a finalidade da formação técnica? Penso que não, mas tal fato cada vez mais se repete. Tenho observado que os cursos técnicos estão se tornando muito teóricos e acadêmicos.
Nos cursos profissionalizantes o problema é ainda maior, justamente naquele que deveria suprir a grande demanda por manutenção. Temos aqui um agravante espinhoso, que é a legislação vigente – e espero que ela seja alterada o mais em breve possível –, que não permite o adolescente menor frequentar aulas práticas. Onde vamos chegar se um rapaz só pode executar serviços de oficina ao atingir a maioridade? Acrescento ainda um tópico de formação pedagógica relacionado às atividades que exigem capacidade de coordenação motora: essa habilidade deve ser desenvolvida justamente na pré-adolescência. Assim, o pessoal com formação profissionalizante para trabalhar em oficina está se tornando “espécie em extinção”.
Joel S. Alves é instrutor nas áreas de Operação e Manutenção de Máquinas e Implementos Agrícolas e Rodoviários *
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