Máquinas e Inovações Agrícolas

Pedagogos da inovação

Disruption significa mutação. Não trata-se apenas de transformação ou mudança. São verdadeiros choques ascensionais neurônicos. No novo agronegócio a palavra de ordem é smart farming.

Uma pesquisa realizada pela Monday Morning Institute, com mais de cinco mil líderes, revelou que as dez maiores preocupações e riscos mundiais são: 1) desemprego e subemprego; 2) pobreza; 3) crises financeiras; 4) má educação; 5) desigualdade econômica; 6) fome e subnutrição; 7) emissão de carbono; 8) desigualdade no acesso à água, saúde e energia; 9) recursos escassos; e 10) falta de água potável.

Ao mesmo tempo, esses líderes elegeram 15 grandes oportunidades para o enfrentamento desses desafios, com cinco fatores fundamentais para os próximos anos: smart farming, digital labour market, redução de desperdício, diminuição de distância do ciclo de conhecimento e tratamentos de saúde de precisão. Isso significa que não basta a inovação. O segredo está em implementar a inovação. Não basta comprar a tecnologia nos “dealers“, é preciso saber utilizá-la e acionar a inteligência humana acima da inteligência artificial. Os ciclos científicos e tecnológicos se mutam em altíssima velocidade. Integrar lavoura, pecuária e floresta (ILPF) nos trópicos brasileiros, por exemplo,  está longe de ser a mesma coisa que saber plantar árvores, criar bois ou colher grãos.

Uma hibridação do conhecimento gera o vigor híbrido dos resultados. Essa força criadora representa a fórmula com a qual vamos vencer os desafios e todos os riscos cada vez mais presentes e plenos de incômodos. Uma mulher que não entendia de agropecuária é, hoje, o símbolo do sistema ILPF, a Marize Porto. E por nada saber antes, seus neurônios estavam abertos para as novas sinapses. Numa visita ao grupo Amaggi, um exemplo de empresa agropecuária, perguntei quem era o melhor operador de máquinas deles e a resposta foi: é uma mulher, a Benigna.

São novos neurônios, com neurônios abertos para aprender, quem vai implementar e implantar as inovações. O desafio das inovações e das novas máquinas não reside mais numa conversa de cientista com técnicos ou em um diálogo de técnicos com clientes. O drama está em “fazer acontecer“. E para isso não pode haver acomodação dos agentes ativos e responsáveis pelos saltos inovativos. Não basta ficar feliz porque os 11% mais capacitados dos clientes sabem usá-los e progridem; não basta se acomodar porque outros 19%, além dos 11%, também aprendem a utilizar o conhecimento e aplicá-lo no campo. A luta pela inovação está em tornar simples, fácil e desejada em um despertar das crianças vivas que existem dentro de cada adulto vivo. Se não houver vontade do seu uso competente, essa inovação se transforma numa brutal concentração do conhecimento, e suas consequências geram mais desigualdade, não contribuem para o desemprego, para a sustentabilidade, a racionalidade da água e da energia, e não combatemos o desperdício planetário.

Quer dizer, sem distribuição do conhecimento, mas acima disso, sem praticar esse conhecimento no campo, a inovação por si só não atacará os grandes dramas e riscos da humanidade dos próximos 10 anos, pois não iremos cuidar do planeta e da vida apenas com os mais dotados, vocacionados e com os dons aflorados. Precisamos de uma pedagogia que leve a tecnologia aos comuns. Os 50% da sociedade que têm mais dificuldades para apreender e implantar o conhecimento ativo no trabalho e talvez os 20% restantes possam optar por imitar os melhores.

As novas gerações são fundamentais para isso, porém, precisam de mentores e líderes. Elas já nascem mutantes, com neurônios mutados, e com novos memes. Porém, a distração é arma inimiga e mortal desses jovens. Cabe aos pais, mestres, mentores e amigos apontarem o caminho do foco. Na fundação Shunji Nishimura de tecnologia temos a cada ano uma ótima “safra” de jovens, formados como tecnólogos de mecanização da agricultura de precisão. Fui patrono de uma turma em 2015. De lá, 70% já saem empregados e vão atuar em empresas do agronegócio que têm a consciência da precisão da gestão de suas operações. E o velho saudoso senhor Nishimura sempre dizia que sua fundação teria como fator predominante e vital criar homens, valores e caráter, acima de tudo.

Assim como tratamento médico de precisão é um dos aspectos apontados pelos líderes na pesquisa mencionada anteriormente, a precisão no agronegócio é o que vai permitir enfrentar os custos ascendentes na agropecuária, vai resolver produtividade com rentabilidade e vai, além disso, viabilizar a sustentabilidade, a vitória do conhecimento sobre a incerteza, trazer visibilidade e orientação ao consumidor final, oferecer rastreabilidade como condição ‘sine qua non’ da gestão e invadir a certificação sensorial, onde alimentos, fibras e bebidas não serão mais vistos pelos formatos estéticos ou embalagens e containers, mas, sim, pelo desmembramento de suas virtudes interiores.

A próxima revolução da inovação é a inovação pedagógica de como ensinar pessoas a superar. Superação é o nome do jogo. Porque para aplicar esse rol amplo de conhecimentos, esse patchworking de aspectos técnicos, essa galáxia de saberes da ciência exata, biológica e humana, é necessário a superação da vontade de aprender, de fazer, pensar, sentir e aprender, fazer, pensar, sentir… E isso num ciclo interminável e rumando ao infinito.

As novas gerações, as mulheres e os seres humanos de todas as idades que guardarem dentro de si o poder da “neotonia“ da fonte eterna da juventude, do aprender a aprender estão na rota do futuro. Mas, atenção: precisamos de pedagogos da inovação, pois precisamos fazer com que até o mais simples e humilde do mundo possa ter acesso e saiba usar com inteligência o conhecimento hoje disponibilizado.

Vendedores do saber fazer. Operários do fazer acontecer e empreendedores das empresas, cooperativas e organizações educacionais: uni-vos.

Inovação sem percepção não faz verão. Inovação para valer é percebida, aplicada, mensurada e assimilada na cultura. A inovação um dia será desnecessária, pois será um hábito necessário.

por José Luiz Tejon, coordenador do Núcleo de Estudos de Agronegócio da ESPM; colunista da Rede Jovem Pan de Rádio e diretor de Biomarketing

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