Máquinas e Inovações Agrícolas

Produtores estão mais atentos à manutenção de máquinas

por Gustavo Paes

As vendas de máquinas agrícolas e rodoviárias cresceram 50,4% em fevereiro na comparação com janeiro de 2016, conforme a Associação de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Foram 2.346 unidades vendidas. O comércio de tratores movimentou 1.912 unidades, contra 1.081 no primeiro mês do ano. Já as vendas de colheitadeiras registraram recuo de 2%, para 329 unidades – oito a menos que em janeiro. Mesmo com essa reação, o número está abaixo do resultado obtido em fevereiro do ano passado, quando foram vendidas 36,5% mais máquinas. No bimestre, a queda é de 44,6% em relação a 2015.

A incerteza quanto aos rumos da economia fez os produtores segurarem os investimentos. Todos estão mais preocupados em manter e consertar as máquinas agrícolas que já têm em vez de fazer um financiamento para a compra de uma nova. A prudência se justifica, já que a aquisição de máquinas agrícolas é considerada um investimento de bem de capital, onde é normal as empresas fazerem análises de retorno de investimento e dos cenários futuros, diz o presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas (CSMIA) da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Pedro Estevão Bastos.

Com a crise política e econômica, o cenário futuro ficou muito nebuloso, avalia o dirigente. “Portanto, é normal haver um adiamento das decisões de compra. Pesquisas da Abimaq/CSMIA em duas feiras no início do ano, a Show Rural Coopavel e Expodireto Cotrijal, mostraram queda de vendas de 21% e 23%, respectivamente, em relação à edição de 2015”, observa. O cenário só deve se modificar com o arrefecimento da crise que o País atravessa, segundo Bastos.

Atentas a essa conjuntura, as maiores companhias do setor estão ajustando o foco e vislumbrando novos nichos. Uma das estratégias é a ampliação da oferta de peças e componentes de reposição. “Se o agricultor prorroga a compra de uma máquina nova, certamente a manutenção das antigas se faz necessária”, declara Estevão.

Peças e serviços

O segmento de reposição responde por 10% a 15% do faturamento das fabricantes de máquinas agrícolas, dependendo da empresa e do tipo de produto que demanda mais ou menos trocas de peças que naturalmente se desgastam. O presidente da CSMIA explica que existe diferença entre a dinâmica das vendas de máquinas novas e peças. O setor de peças não tem variações tão bruscas quanto às vendas de máquinas. “Como o setor de máquinas novas tem caído fortemente e o setor de peças tem quedas menos expressivas, a participação de peças no faturamento das empresas tende a crescer”, prevê.

O mercado de peças de reposição e serviços agradece. “Em vez de trocar o equipamento neste ano, o agricultor está deixando para fazer isso mais adiante. E vai precisar de mais peças para reposição”, afirma o gerente corporativo de peças da concessionária  Igarapé, da New Holland, Fernando Mourão. Em geral, o segmento de peças representa entre 25% e 30% do faturamento da companhia.

A Igarapé possui dez lojas na Região Sudeste, sendo cinco delas em São Paulo  e outras cinco no Sul de Minas Gerais.

A empresa fez uma campanha dando um prazo de cinco meses para os produtores fazerem o pagamento e colheu bons resultados. “Nos períodos de novembro de 2014 a fevereiro de 2015 e de novembro de 2015 a fevereiro de 2016 tivemos um incremento de 73% nas vendas de peças para colheitadeiras”, diz Mourão. As vendas de peças de reposição para tratores aumentaram entre 15% e 20% no mesmo período.

A crise também aumentou o movimento nas oficinas da concessionária nos três primeiros meses do ano, época de colheita. Por isso, a Igarapé criou um plantão de safra, com uma equipe de mecânicos à disposição aos sábados, e à distância, durante domingos e feriados. “O plantão anual é uma prática rotineira, mas o movimento nas oficinas justificou a estratégia. O produtor não pode ficar com a máquina parada no momento em que ele mais precisa”, completa Mourão.

Cautela nos negócios

Com o cenário nebuloso na economia e na política, a ordem na Agritech-Lavrale, fabricante dos tratores e cultivadores motorizados Yanmar Agritech, é ter prudência. “Estamos com muita cautela em relação aos episódios político-econômicos. Reduzir custos, adequando a estrutura ao tamanho do market share, é o caminho para a sobrevivência”, assegura o gerente de Marketing e Pós-venda da empresa de Indaiatuba (SP), Pedro Cazado Lima Filho.

O executivo acredita que o produtor substituirá os investimentos em máquinas novas pelo conserto das que possui na fazenda. “Com a dificuldade de aquisição de equipamentos novos, seja pela dificuldade de obtenção de linha de crédito ou pela incerteza do futuro econômico no Brasil, os agricultores investem na reforma e manutenção dos equipamentos que possuem, e assim garantem sua produtividade”, assinala. A tendência para este ano é o aumento por serviços e peças de reposição, segundo ele. “Quem sai ganhando com essa situação é o produtor, que tem a seu dispor um número de ofertas de produtos para todos os tamanhos e bolsos”, afirma Lima Filho.

Valorização das concessionárias

O gerente comercial de tratores da Agrale, Eduardo Cesar Nunes, diz que a empresa aposta em dois cenários para o mercado de máquinas agrícolas. O primeiro, em que os produtores mais mecanizados, que adquiriram tratores e colheitadeiras novos e alcançaram elevados índices de produtividade, vão seguir investindo na renovação do maquinário. “Eles estão cautelosos no momento, mas com a safra recorde que é esperada, deverão ficar capitalizados e fazer a troca dos equipamentos”, estima.

O outro cenário vislumbrado pela Agrale envolve o produtor que fez uma ou outra aquisição de máquinas novas, mas está esperando o momento certo para trocar o equipamento usado. E que precisará de peças para evitar uma pane na hora da colheita. “Esse produtor comprou um trator, mas ainda tem um velhinho e vai precisar fazer a manutenção”, avalia.

Pensando nesses dois cenários, a Agrale vem valorizando a sustentabilidade das 93 concessionárias de tratores que possui no País, com a venda de peças e serviços. A empresa mantém um centro de distribuição, de onde são expedidas mais de 130 mil peças por mês. “A Agrale possui 4,5 mil linhas de diferentes produtos para tratores. As concessionárias oferecem quase 100% do que o produtor precisa”, garante Nunes.

A empresa, que registra queda nas vendas de tratores similar à do mercado, tem buscado fornecedores locais para reduzir os custos de produção e investido nas exportações, especialmente para a América do Sul e África.

“No ano passado, fornecemos cerca de 400 máquinas para o governo do Zimbábue, por intermédio do programa Mais Alimentos Internacional”, destaca o gerente.

Foco na inovação 

A Stara também foi afetada pela retração nas vendas, mas não parou de lançar produtos. “Em um ano de crise, o produtor não sai de casa para comprar um equipamento que já tem. Ele quer adquirir uma máquina inovadora, para aumentar a produtividade e obter lucro”, ressalta o gerente comercial da Stara, Márcio Elias Fülber.

O executivo diz que, com a queda nas vendas de máquinas novas, o produtor está buscando mais os serviços das oficinas das concessionárias para fazer a manutenção. “Chegou a vez da venda de peças, do setor de serviços, das revisões das máquinas agrícolas”, decreta Fülber.

A empresa tem um centro de distribuição e oferece aos produtores itens de reposição de alto desempenho. “As peças são projetadas e produzidas com as mesmas tecnologias das máquinas e certificação ISO 9001, garantindo bom desempenho e durabilidade das máquinas”, frisa Fülber.

Ele observa que as fabricantes que possuem uma rede estruturada de concessionárias – a Stara tem 60 concessionárias e 122 pontos de venda – terão melhores condições de superar o período de crise e estarão mais preparadas quando os produtores voltarem às compras.

“As empresas que oferecem produtos inovadores e que trazem custo-benefício vão se sobressair quando o mercado voltar ao normal”, projeta Fülber. Ele não arrisca fazer previsões, mas espera que isso ocorra o quanto antes.

Fator propulsor

Paulo Acosta, gerente Comercial da TVH-Dinamica – empresa de distribuição de peças e acessórios para as linhas de movimentação, industrial e agrícola – concorda que a queda nas vendas de novos equipamentos é um fator que pode impulsionar a manutenção da frota de máquinas em operação. “É um efeito natural. Contudo, quando a situação da economia não é favorável e há instabilidade na esfera do governo, o produtor fica receoso e acaba substituindo somente o necessário para manter a máquina funcionando”, afirma. “Estamos presenciando isso neste momento.”

Acosta diz que o produtor tem a preocupação de manter o equipamento em bom funcionamento e, para isso, a manutenção se faz necessária. “As janelas de plantio e colheita são cada vez menores, por isso, a máquina não pode parar, pois traria perdas irreparáveis”, argumenta. Neste cenário, o ideal é fazer a manutenção preventiva do equipamento, seguindo as recomendações do fabricante para não ter surpresas desagradáveis, segundo ele. “Com isso, o produtor também economiza, pois a troca corretiva é muito mais onerosa do que a preventiva”, destaca.

O executivo salienta que a TVH-Dinamica acredita na força do agronegócio brasileiro e tem investido em desenvolvimento para ampliação e lançamento de novas linhas de produtos. “Temos projetos a longo prazo no Brasil e acreditamos que o segmento deve crescer nos próximos anos”, salienta.      

Além disso, Acosta lembra que a empresa aumentou a capacidade de armazenagem dos produtos, concentrando tudo no centro de distribuição em Vinhedo (SP). “Também estamos reforçando a nossa linha, com as marcas próprias Bepco e Tractorcraft, bem como estabelecendo parcerias com fornecedores locais”, adianta.

O gerente comercial admite a possibilidade de a TVH-Dinamica – no Brasil desde 2000 – utilizar matéria-prima nacional para reduzir os custos de produção. “É uma estratégia que pode ser usada. No caso da TVH-Dinamica, trabalhamos nas duas frentes: produtos vindos da matriz, na Bélgica, e dos Estados Unidos, e itens de fornecedores locais”, declara.

Acosta enfatiza que a empresa conta com um estoque global de 600 mil itens entre agrícola, movimentação e industrial, que atendem mais de 21 milhões de referências. No Brasil, a empresa possui mais de 25 mil itens a pronta-entrega e 100 mil cadastrados.

Tendência de crescimento

“No mercado de reposição, a tendência é de crescimento devido ao aumento na manutenção das máquinas seminovas”, confirma o gerente nacional de Vendas Aftermarket da Hella do Brasil, Marcos Massao Osako. “Notamos uma demanda crescente no mercado de reposição, inclusive com itens de maior tecnologia, como faróis LED”, ressalta.

Em um cenário de baixo investimento, a opção pela manutenção das máquinas seminovas é a melhor escolha, segundo ele. No entanto, o produtor deve se atentar à qualidade das peças utilizadas, priorizando peças originais, recomenda Osako. “Muitos não consideram que, ao trabalhar com peças de baixa qualidade, acabam tendo custos adicionais devido às paradas não programadas e o custo da máquina parada”, salienta.

Como dito, a retração nas vendas de máquinas novas fez com que as fabricantes passassem a apostar em outros segmentos, como o de peças de reposição, para alavancarem as vendas. “Aliado a esse crescimento, a Hella passou a vender um conjunto de faróis LED destinado ao ‘upgrade’ das máquinas seminovas já existentes no mercado”, revela o executivo. Na empresa, as peças mais demandadas pelas montadoras de máquinas são itens de iluminação (farol principal, farol de trabalho, iluminação interna e lanternas), além de componentes eletrônicos como buzinas, relês, sensores, interruptores e pedais.

Outra empresa, a NSK Brasil – que fabrica rolamentos de esferas, com diâmetro interno desde 7mm a 80mm, para atender ao mercado industrial e automotivo brasileiro – não está tão otimista quanto à retomada do mercado de máquinas e implementos agrícolas. O gerente de Planejamento Estratégico e Marketing da empresa, Luiz Granjo, acredita que 2016 terminará bem parecido com o ano de 2015 na parte de vendas para o segmento. “Em vez de os produtores agrícolas comprarem uma máquina nova, realizam reformas e têm trabalhado com as máquinas existentes.”

Segmento atraente

No Brasil desde 1958, a Schaeffler do Brasil fabrica peças para motores, transmissão e chassi, assim como componentes para as indústrias agrícola e ferroviária, produtos de consumo e segmento aeroespacial. A companhia, que reúne as marcas INA, FAG e LuK, aposta que a área de reposição do mercado agrícola seguirá sendo atraente, mesmo com o recuo nas vendas de máquinas. “Embora sem expectativas para novos investimentos em equipamentos, o mercado agrícola na área de reposição continua sendo promissor, já que não enxergamos queda na demanda a curto prazo”, avalia o gerente de Distribuição Industrial Brasil, Alexandre Nascimento.

O executivo analisa que, embora haja uma tendência de aumento na demanda por manutenção de equipamentos, esse movimento possa ser frustrado caso hajam restrições orçamentárias que aumentem o período normal de manutenção dos equipamentos.

Nascimento também comenta as adaptações feitas pela indústria e que beneficiam os produtores rurais. “Em razão das montadoras estarem com a demanda retraída, nossa disponibilidade de peças tende a ser maior, possibilitando ao produtor uma facilidade maior de planejamento e talvez a redução dos seus estoques”, explica. A tendência é que as montadoras busquem alternativas para que o resultado das empresas mantenha-se dentro do orçado. “A reposição e oferta de serviços deve ser o caminho a ser seguido nos próximos meses”, projeta.     

Compasso de espera

A Mallas’Car Indústria e Comércio de Máquinas Agrícolas, de São Paulo, está aguardando uma definição da crise política e econômica que o País atravessa. “Temos de aguardar o que os parlamentares vão fazer. E, enquanto isso, não dá para realizar qualquer projeção”, avalia o diretor Laércio Guimarães. A empresa segue trabalhando para atender à demanda de peças agrícolas para as linhas New Holland/Ford, Valtra/Valmet, Massey Ferguson, Agrale, CBT, Case, Jacto, Fiat Allis e Hyster. “A nossa empresa está em constante desenvolvimento de itens novos. Todo mês fazemos lançamentos de novos produtos”, garante.

Prestes a completar dez anos, a Mallas’Car produz cerca de 4 mil peças a cada mês e conta com mais de 1 mil itens em estoque. “Nós produzimos paras as fabricantes de máquinas agrícolas alavancas, buchas, eixos, parafusos, porcas, anéis e garfos, entre outras peças”, salienta Guimarães.

A queda acentuada nas vendas de máquinas agrícolas deixou os produtores rurais receosos de fazer novos investimentos, conforme o diretor da Mallas’Car. Os agricultores estão preferindo fazer a manutenção do maquinário a comprar um novo equipamento. Mas até o momento isso não vem refletindo no aumento da comercialização de peças da empresa, segundo ele. “Há produtores usando as máquinas até elas quebrarem para então abrir e fazer a troca do que for estritamente necessário. Mas o correto seria eles fazerem uma manutenção preventiva”, adverte.

Estudo divulgado pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em parceria com o Centro de Inteligência de Mercado da Universidade Federal de Lavras (CIM/UFLA), evidencia que a mecanização eleva a produtividade no campo. De acordo com o levantamento, a produção de café no ano passado foi 26% maior nas regiões onde a atividade é mecanizada em comparação com as áreas onde o trabalho manual é dominante. O estudo coletou informações sobre custos em 12 municípios de seis estados produtores de variedades de café. Os resultados apontaram que o prejuízo nas atividades foi registrado na maioria das regiões analisadas, em exceção ao município de Luís Eduardo Magalhães (BA), no qual a mecanização foi implementada – e onde o faturamento foi maior do que os gastos com a atividade.

“Fica claro que a constante modernização tecnológica desponta como fator-chave para promover o progresso das atividades realizadas no campo. Principalmente no Brasil, um dos maiores representantes da agricultura no mundo, o avanço das operações com tratores agrícolas assumiu um papel crucial para extrair ao máximo o potencial das terras”, analisa Flavio Bajon Filho, da Controlflex, empresa fabricante de cabos de comando para máquinas do setor agrícola. O executivo considera que, embora muitas das condições no campo tenham melhorado, ainda há, em muitas regiões do Brasil, uma frota antiga de máquinas agrícolas, bem como de condições inadequadas para os operadores dessas máquinas. “Existe uma necessidade enorme para realizar investimentos nas operações agrícolas, por meio de aquisições de máquinas modernas; equipamentos e peças de qualidade, como cabos de acionamento mecânico que garantem a operação adequada da máquina agrícola; além de novos estudos para o preparo do solo, plantio, cultivo, colheita e no transporte e manuseio de produtos”, completa Bajon.

 

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