Máquinas e Inovações Agrícolas

Transformação dos sistemas reduz idas ao mecânico

Soluções possibilitam mais segurança e reduzem custos com combustível e manutenção

De Gustavo Paes

 

Por muitos anos, o sistema hidráulico de máquinas agrícolas esteve associado ao engate de três pontos, que tinha como principal função transmitir força para diversos pontos do trator agrícola. A força hidráulica era utilizada para movimentar mecanismos do próprio sistema e de máquinas acopladas ao equipamento. Mas, a partir do final dos anos 1980 e começo dos 1990, ocorreu uma grande evolução e os comandos hidráulicos foram aperfeiçoados, permitindo controles de profundidade, sensibilidade e vazão.

“A força hidráulica era utilizada apenas no engate do terceiro ponto do trator, para suspender o implemento agrícola. Depois, surgiu a direção hidráulica e, na sequência, a hidrostática, que é usada pelos modelos atuais”, afirma o instrutor Joel Sebastião Alves, especialista nas áreas de operação e manutenção de máquinas e implementos agrícolas e rodoviários.
Alves, que é instrutor do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai-RS), salienta que o sistema hidráulico é muito mais eficiente, rápido e versátil, e permite que as operações sejam mais ágeis e com menos riscos. E lembra que a tração hidráulica é muito utilizada em máquinas agrícolas, especialmente em pulverizadores autopropelidos, tratores e colhedoras. Uma evolução bem significativa foi a hidráulica sendo usada para tração, lembra o instrutor. “A vanguarda foram os pulverizadores autopropelidos onde a tração hidráulica aboliu a transmissão mecânica, embreagem, eixo, caixa e diferencial”, assinala.

Os componentes do sistema hidráulico foram sendo aprimorados pela indústria, especialmente os filtros, as bombas e as válvulas de controle. Alves aponta que, inicialmente, as válvulas ficavam espalhadas pela máquina e hoje estão centralizadas em pontos estratégicos do sistema hidráulico. “O manifold é um bloco que centraliza todas as válvulas e o sistema de comando”, explica.

Outro componente que teve avanços são as bombas hidráulicas. As bombas hidráulicas de pistão, utilizadas com a função de transformar energia mecânica em energia hidráulica, podem ser axial ou radial. Elas substituíram as bombas de engrenagem, que operavam com no máximo 200 quilos de pressão por centímetro quadrado. “Esse sistema radial trabalha com pressões muito maiores e alguns equipamentos operam com 300 a 400 quilos de pressão por centímetro quadrado”, diz Alves. “Essa bomba proporciona mais do que o dobro de pressão no sistema, o que permite um incremento da força final na mesma proporção”, completa.

O engenheiro agrônomo e consultor em mecanização Arno Dallmeyer salienta que o grande ganho da entrada da hidráulica na mecanização durante os últimos 100 anos foi e redução do esforço dos operadores dos primeiros tratores, que chegavam a pesar 4 ou 5 toneladas. O especialista, professor aposentado da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), não acredita que a hidráulica seja substituída pela eletrificação. “A hidráulica não vai acabar”, afirma. “Grandes transferências de peso seguirão sendo feitos com a hidráulica”, acrescenta.

Uso contínuo

Fundada em 1923, na Alemanha, a Bucher Hidráulica, no Brasil desde 2013, fabrica componentes e sistemas hidráulicos que podem ser aplicados em diversos segmentos, como máquinas para agricultura e florestal, produtos para movimentação de materiais e logística, plataformas veiculares e máquinas e equipamentos para o setor de construção.

Rinaldo Sanches Fernandes, da Bucher

Para máquinas agrícolas, a companhia produz bombas, motores hidráulicos de carregamento interno por alta rotação (QXM), válvulas de cartucho, válvulas divisoras de fluxo sem elementos rotativos (MTDA), blocos manifold, eletrônicos, cilindros, unidades hidráulicas e comandos hidráulicos de centro aberto e centro fechado. “São produtos que a empresa tem vantagem competitiva por ser superior em desempenho aos concorrentes”, destaca o gerente-geral Rinaldo Sanches Fernandes.

Os motores hidráulicos de engrenagem interna QXM Móbil e as válvulas (divisores de vazão) MTDA são fornecidos para a Kuhn Brasil, de Passo Fundo (RS), que fabrica semeadoras, plantadoras, distribuidores de fertilizantes, trituradores e pulverizadores. “Também temos como clientes a Vence Tudo, de Ibirubá, e a JAN, de Não-Me-Toque”, acrescenta Fernandes.

O gerente-geral da Bucher Hydraulics aposta que a hidráulica seguirá sendo usada nas novas máquinas agrícolas. “A perspectiva é de crescimento do uso da hidráulica em máquinas e implementos agrícolas, com a demanda de consumidores independentes por funções específicas”, projeta o executivo.

Blocos manifolds

A Eaton fornece componentes hidráulicos para os principais fabricantes de equipamentos rodoviários e off-road dos mercados agrícola, de construção, mineração, marítimos e off-shore, além de atuar também no setor industrial.

O especialista em produto da Eaton, Jair Apolinário, destaca que o portfólio da Divisão Hidráulica da empresa inclui bombas hidráulicas, motores hidráulicos, transmissões hidrostáticas, cilindros hidráulicos, filtros hidráulicos, servo-válvulas, mangueiras, blocos manifold, além de motores de circuito fechado e aberto. “A empresa ainda fabrica componentes mecânicos como caixa de cilindro ou parte de transmissão para máquinas agrícolas, especialmente para tratores e colhedoras”, afirma o executivo.

Apolinário salienta que o óleo contaminado por partículas sólidas ou deteriorado pelo uso, pela temperatura ou pela mistura com água pode comprometer os componentes de um trator, colhedora de grãos, colhedora de cana ou pulverizador. Essa contaminação é responsável por cerca de 80% das falhas no sistema hidráulico. Por isso os agricultores devem se atentar para a qualidade do fluído que está em uso.

O especialista alerta que a contaminação do óleo é invisível aos olhos e não pode ser confundida com a sujeira. “Para descobrir se o óleo está sujo, os mecânicos, geralmente, fazem o teste de viscosidade com os dedos e avaliam a contaminação pela aparência. Mas o olho humano enxerga até certo limite, até 40 micras, e as partículas de sujeira têm duas, quatro micras, que ele não consegue ver”, afirma.

O óleo contaminado provoca a perda da função, queda no desempenho da máquina, falhas, desgastes e menor eficiência no sistema hidráulico, além de maior consumo de combustível “Se o produtor fizer a manutenção adequada do sistema hidráulico trocando o filtro e o óleo hidráulico nos prazos recomendados pelo fabricante ele vai prolongar a vida útil do equipamento”, ensina.

O fluído hidráulico possui quatro funções importantes que contribuem para o bom funcionamento das máquinas agrícolas: transmite energia de um ponto a outro; lubrifica as peças móveis; veda folgas e ainda resfria os componentes. Uma dica é observar a viscosidade original do óleo, pois isso impacta em sua capacidade de lubrificar e de vedar as folgas, além de impactar o efeito na geração de calor pelo atrito entre as moléculas do óleo. Dependendo da temperatura em regime de trabalho, o óleo pode se tornar tão fino que não evitará o contato metal-metal. Os componentes hidráulicos, em regra, possuem um limite mínimo de viscosidade que não deve ser ultrapassado.

“Quando o óleo está contaminado, ele age como uma lixa líquida, que desgasta a superfície dos componentes, fazendo-os perder sua forma, acabamento, aumentando as folgas e, assim, prejudicando a eficiência do produto”, comenta Apolinário. O especialista de produto da Eaton lembra que grande parte dos produtores esquece-se de trocar o respiro do reservatório de óleo hidráulico. “O respiro é a parte mais esquecida do sistema. A troca tem um investimento baixo e precisa ser feita com mais frequência”, recomenda.

E avisa que nem mesmo o óleo novo está livre de contaminação. “Todo óleo tem que passar por filtragem antes da aplicação nas máquinas. Ele está limpo, mas não está descontaminado o suficiente. Nem sempre trocar o óleo em uso por um novo sem filtrar, será a melhor solução”, diz.

Válvulas multifuncionais

Criada em 1985, a HydraForce Hydraulics, que tem fábricas localizadas em Lincolnshire (Estados Unidos), Birmingham (Inglaterra), Changzhou (China) e em São Paulo, projeta e fabrica válvulas de cartucho eletro-hidráulicas de alta performance, blocos de comando customizados e controles eletro-hidráulicos. “Hoje, o diferencial são as válvulas multifuncionais, manifolds de tamanho reduzido que agregam funções de outras e você consegue a redução de custos em função da diminuição do tamanho do bloco de comando, mantendo o desempenho da função hidráulica da máquina”, afirma o gerente de Marketing América do Sul, Adriano Mônaco.

No Brasil, a Hydraforce fornece componentes hidráulicos para grandes fabricantes de máquinas, como a Caterpillar, Jacto, AGCO, CNH, John Deere e Stara. “Contamos com mais de dois mil produtos nas mais diversas funções”, completa. Em 2017, segundo ele, a empresa fabricou 13 milhões de válvulas de cartucho, 1,3 milhão de manifolds e 13 mil manifolds hidráulicos customizados.

O executivo lembra que os pulverizadores modernos são projetados para aumentar a eficiência e diminuir o desperdício. A precisão requer exatidão, confiabilidade e repetição a partir da hidráulica da máquina. A Jacto apresentou recentemente várias máquinas que utilizam os blocos da Hydraforce, conforme Mônaco. “Os produtos estão disponíveis para todas as funções da máquina, como abrir e fechar a barra de pulverização, controle de precisão da altura da barra, suspensão da barra/eixo, piloto automático e o controle de bomba de produto”, explica.

A empresa fabrica ainda válvulas de controles de pressão para plantadoras e semeadoras, que estão se tornando cada vez maiores e trabalham com velocidades mais altas, para cumprir com a pequena janela de plantio. “Os controladores de pressão permitem o controle da profundidade de plantio de forma consistente e em solos variados”, assegura o executivo.

Filtros hidráulicos

A Argo-Hytos, que possui unidades de produção na Alemanha, Índia, China e Polônia, fabrica válvulas, sistemas solenoides, unidades de energia hidráulica, interruptores de pressão e drives hidráulicos, entre outros produtos. “Na área agrícola, a empresa ainda fabrica blocos manifolds hidráulicos e filtros hidráulicos, que contemplam os filtros de retorno, de pressão, de linha, de retorno e sucção”, salienta o engenheiro de projetos e aplicações da Argo-Hytos, Nolber Jhonatan Gómez Arandia.

Nolber Jhonatan Gómez Arandia (Argo-Hytos)

Faz parte ainda do portfólio indicadores de sujeira dos filtros hidráulicos, contadores de partículas, sensores de umidade, sistemas de filtragem off-line e carrinhos de filtragem para abastecimento das máquinas. A empresa desenvolve ainda soluções para o monitoramento online de fluidos.

Esses sistemas de medição inteligentes usam algoritmos para monitorar o envelhecimento dos lubrificantes e o desgaste dos componentes hidráulicos. Os sistemas de medição detectam problemas em estágio inicial e as informações em tempo real sobre o status da máquina, por meio de monitoramento remoto e experiência em dados, aumentam a disponibilidade do equipamento, reduzem o tempo de inatividade e estendem a vida útil da máquina, dos fluidos e dos componentes.

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