Relação máquina e solo: capacidade de tração

Aspectos de desempenho das máquinas agrícolas para uma boa gestão

Por MSc. Lara Marie Guanais Santos e Prof. Dr. Ricardo Ralisch*

Trataremos da importante relação que há entre o solo e os equipamentos agrícolas. Por se tratar de tema amplo e complexo, dividiremos em duas edições. Nesta abordaremos os aspectos de desempenho das máquinas e no próximo enfocaremos os efeitos no solo. Separamos os assuntos para dar maior embasamento teórico em cada tema e enfatizar aspectos fundamentais para a boa gestão da atividade agropecuária e das máquinas agrícolas.

Quais operações interagem com o solo?

Todas, com exceção das aplicações aéreas de insumos, com aviões, helicópteros, drones, vants ou semelhantes. Em todas as demais operações agrícolas há interação de algum equipamento ou componente com o solo e o exemplo clássico é o tráfego das máquinas e o comportamento dos rodados.

Tratores

O termo ¨trator¨ deriva do equivalente em inglês ¨tractor¨ originado na contração dos termos ¨traction motor¨, cuja tradução é motor de tração. E os tratores agrícolas são exatamente isso, motores equipados para realizarem a tração, geralmente de implementos agrícolas.

Esta tração é obtida pela transmissão e conversão da potência gerada pelo motor em torque nos rodados de tração, que são as esteiras ou os pneus. Este torque nos rodados é aplicado ao solo, cuja resistência a esta força aplicada se converte em deslocamento do trator, em sentido oposto à resistência oferecida. A capacidade de tração dos tratores depende diretamente da interação dos rodados com o solo e, obviamente, das características e condições de ambos.

Quanto menos coesão a superfície do solo tiver, menos resistência aos rodados ela oferece, se deforma mais e reduz a capacidade de tração do trator. Da mesma forma, quanto pior for a condição dos rodados de tração, pior será o contato com a superfície do solo, reduzindo a capacidade de tração do trator. Portanto, a capacidade de tração do trator se inicia na potência gerada pelo seu motor. Passa pela transmissão do trator e chega nos rodados, promovendo o deslocamento, com uma potência disponível para realizar a tração que é definida como Potência na Barra de Tração, ou PBT.

Esta PBT é sempre menor que a potência do motor, com uma eficiência que depende das características da transmissão, se é mecânica ou hidráulica, se tem multiplicadores de velocidade ou não, quantidade de marchas, tipos e características da coroa e pinhão e das reduções finais e, finalmente, do tipo e das condições dos rodados, como pressão interna e vida útil dos pneus no caso dos tratores de rodas. Num trator de rodas hipotético, com transmissão mecânica, tração 4×2, em boas condições e operando adequadamente em solo firme, sem preparo, estima-se que apenas 45 a 55% da potência do motor esteja disponível para tração na barra de tração.

Algumas destas características são intrínsecas ao trator, fazem parte do projeto que os tornam mais ou menos eficientes e não alteramos, mas algumas dependem de decisões gerenciais na forma de operar o trator e das manutenções adequadas. Vejamos quais:

Velocidade operacional

A velocidade afeta a disponibilidade de potência do trator para realizar a tração, pois esta potência disponível é limitada e quanto mais rápido se faz uma operação, mais potência se necessita. As operações que mobilizam o solo são as que merecem mais atenção quanto a velocidade, pois nestes casos há uma interação de alguns mecanismos do implemento com o solo. A velocidade deve ser adequada à forma de ação destes mecanismos e ao tipo do solo. Trataremos disto no próximo artigo.

Outra preocupação quanto a velocidade é o efeito “galope” das máquinas, que são os tratores e os autopropelidos. Sabemos que estas máquinas não possuem suspensão nos eixos, logo o efeito da sua oscilação vertical causada pelo deslocamento é absorvido inteiramente pelos rodados e transferido para o solo. Portanto, quanto maior a velocidade operacional, maior o “galope” da máquina e maiores são as pressões sobre o solo e consequentemente sua compactação.

Seleção de marcha

A escolha da marcha a ser empregada nas diferentes operações é fundamental para a eficiência da operação e, por ser um assunto negligenciado pela maioria, é um dos erros operacionais mais frequentes.

Lembrem-se que o que define a velocidade operacional é a marcha selecionada, com o motor se comportando como estacionário. Definida a velocidade operacional pretendida, seleciona-se a marcha em que a rotação do motor esteja o mais próximo de seu regime de maior potência. Isto fará com que a operação se torne mais econômica, permitindo ao motor atuar em seu regime de maior eficiência. Num motor bem concebido, um eventual aumento de demanda de tração durante a operação, o motor reduz naturalmente a rotação, empregando a reserva de torque, sem interferência do operador.

Um trator deve oferecer ampla gama de marchas, para que as diferentes velocidades disponham de algumas marchas que a atendam e o operador deve escolher a mais longa e mais econômica, num regime do motor dentro da faixa de “Reserva de rotação”, de preferência mais próximo da rotação de máxima potência. Desta forma, disporá de marchas mais curtas em uma eventual necessidade de aumento da capacidade de tração onde a reserva de torque do motor não for suficiente.

Assim, se privilegia a velocidade pretendida, de forma mais eficiente e econômica da máquina e são nestas situações que os multiplicadores de velocidades são muito úteis, pois permitem uma pequena redução de marcha sem nenhuma interrupção da operação.

Rodados

Em termos de rodados, os tratores agrícolas se diferenciam em esteira e de rodas. Daremos mais ênfase aos tratores de rodas e a atenção devida aos pneus. Por haver alguns tratores da construção civil, com esteiras metálicas associados às atividades agrícolas e já haver no mercado opções de tratores agrícolas com esteiras e esteiras de borracha adaptáveis, daremos algumas informações básicas.

Como proposta, as esteiras possuem mais área de contato com o solo, aumentando a eficiência de tração. Consequentemente, reduzem a compactação do solo e o efeito galope, por distribuir as pressões em maior área. Têm um custo inicial alto, mas as manutenções preventivas são mais espaçadas que nos pneus.

Estas manutenções em esteiras metálicas são mais especificas e devem ser seguidas para aumentar sua vida útil. Em geral se tratam de inspeções visuais nos pontos de desgastes como roletes, segmentos da roda dentada, verificando seus parafusos de fixação, bordos da esteira e suas buchas. Verificar também se não há vazamentos de óleo nos roletes lubrificados.

Já as esteiras de borracha, originais em alguns tratores ou adaptadas, permitem o tráfego em vias pavimentadas, mas isto reduz sua vida útil por aumentar o desgaste e deve ser evitado. O tensionamento da esteira é hidráulico e permanente, sendo que a manutenção deve visar sua lavagem periódica para reduzir os atritos, troca de óleos dos sistemas lubrificados e inspeção de desgaste da banda de rodagem das esteiras. Como sempre, recomenda-se que se adote o procedimento de manutenção preventiva orientado pelo fabricante, para atender às especificidades não trazidas aqui.

Quanto aos pneus, destacaremos algumas ações que são importantes para otimizar a capacidade de tração das máquinas, aumentando suas eficiências e reduzindo seus custos operacionais. Da mesma forma, estas ações repercutirão em menor impacto sobre o solo, reduzindo as consequências negativas das operações agrícolas.

Desgaste

Nos pneus agrícolas de tração, as garras são concebidas e construídas nos pneus para aumentar sua capacidade de tracionar sobre o solo, que sofrerá uma deformação sob esta pressão, aumentando a área de contato. Portanto, é fundamental que estas garras possuam uma altura mínima da banda de rodagem, pois sua redução, diminui a capacidade de tração do trator, aumenta a patinagem, reduzindo a eficiência da máquina e aumenta o custo operacional.

Recomenda-se usar o pneu agrícola até que a altura da garra atinja 1/3 de sua altura inicial. Verifique também se este desgaste é regular em toda a banda de rodagem dos pneus, pois um acentuado desgaste no centro denota emprego de pressão de insuflação alta, enquanto se este desgaste for nas laterais, denota baixa pressão.

Pressão de insuflação

Trata-se da pressão interna do pneu, que deve estar na faixa recomendada pelo seu fabricante, para evitar os desgastes citados anteriormente. Além disto, pressões incorretas reduzem a área de contato da banda de rodagem do pneu com o solo, diminuindo sua capacidade de tração, aumentando a patinagem e os custos operacionais, já que a vida útil do pneu também reduz. Pressão interna alta também aumenta a pressão externa exercida pelo pneu sobre o solo, acentuando o efeito de compactação e do “galope” da máquina.

Pressões internas inadequadas tendem a fazer com que haja mais patinagem das máquinas, com todas as consequências negativas disto. Para minimizar estes problemas, habituem-se a verificar esta pressão ao menos semanalmente.

Lastros

Toda máquina agrícola permite alguns recursos de lastreamento, visando aumentar sua massa, em função da exigência de tração da operação a ser realizada. As operações podem ser chamadas de “pesadas, médias ou leves” em função da exigência de tração, associado, justamente, a esta alternativa operacional do lastreamento. Lastros em excesso oneram as operações agrícolas, por aumentar o consumo de combustível e o desgaste dos pneus, além de aumentar a compactação do solo. Lastros em falta, diminuem o contato dos pneus com o solo e aumentam a patinagem dos rodados de tração. É justamente este critério que deve ser usado para se avaliar o lastreamento, pois nas operações agrícolas com tratores de pneus a patinagem deve ficar entre 5 e 13%.

Há algumas formas de se adicionar lastros ao trator, como a inclusão de pesos metálicos nos rodados ou até mesmo água no interior dos pneus. Os melhores lastros são os que se aplicam nos rodados de tração, porém, em alguns casos e acoplamentos de implementos, os lastros dianteiros nos tratores favorecem a distribuição de pesos entre os eixos.

Eis algumas regras básicas que auxiliarão a empregar os equipamentos agrícolas com mais eficiência e com melhores resultados.

Boa safra e até a próxima edição!

Referências:

OKUNO, M. O que você precisa saber sobre reserva de torque. www.inteliagro.com.br

MANTOVANI, Evandro Chartuni; LEPLATOIS, Michael;

INAMASSU, Ricardo Yassushi. Automação do processo de avaliação de desempenho de tratores e implementos em campo. Pesq. agropec. bras.,  Brasília ,  v. 34, n. 7, p. 1241-1246,  July  1999 .   Available from <encurtador.com.br/fjktD>. access on  15  Apr.  2020.

*MSc. Lara Marie Guanais Santos – doutoranda em Agronomia – UEL Prof. Dr. Ricardo Ralisch – Depto Agronomia – UEL

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