Farsul: “RS precisa de um subsídio significativo para o seguro rural”

O Estado pode receber investimento de R$ 500 milhões no seguro agrícola pelo Plano Safra 2024/25; em entrevista, Gedeão Pereira também comenta os impactos das enchentes na produção de soja e arroz

Gedeão demonstra preocupação com a possível importação de arroz e enfatiza que o mercado local tem capacidade de suprir a demanda // Foto: Wenderson Araujo/Trilux

Clarisse Sousa – As enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul causaram prejuízos incalculáveis, resultando na morte de 151 pessoas e mais de 800 feridos, conforme boletim divulgado pela Defesa Civil nesta quinta-feira (16). Além das perdas humanas, os danos materiais são enormes e ainda estão sendo avaliados. A agricultura do Estado estima uma perda de R$ 1,3 bilhão, de acordo com a Confederação Nacional dos Municípios (CNM).

Nas regiões afetadas, as culturas de soja e arroz foram impactadas pelas chuvas intensas, provocando atrasos na colheita e perdas de qualidade. Na chamada metade Sul do Rio Grande do Sul, o impacto maior foi na produção de arroz. “As enchentes nos pegaram já no fim da colheita de arroz. Ainda faltam cerca de 15% a 20% para ser colhido”, explicou o presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Gedeão Pereira, ao Portal Máquinas Agrícolas.

Na entrevista, ele comenta sobre o agravamento dos problemas de infraestrutura logística devido às enchentes, afetando o acesso a áreas agrícolas. “Estamos enfrentando muita dificuldade de acesso, principalmente na metade Norte, com consequências sérias na produção leiteira, suína e de frangos”, diz. Gedeão também demonstra preocupação com a possível importação de arroz e enfatiza que o mercado local tem capacidade de suprir a demanda.

Clima reduz estimativa de produção de soja, apesar de aumento na área cultivada

Ele também menciona as propostas em discussão com o governo federal para atender os produtores rurais afetados, como mais crédito para reconstrução e a suspensão de dívidas. Destaca ainda as propostas enviadas para o Plano Safra 2024/25, como a solicitação de “15 anos de prazo, com dois anos de carência e juros de 3% ao ano”. A prioridade, no entanto, de acordo com Gedeão Pereira, é o seguro agrícola.

“Nós temos discutido amplamente com o governo a questão do seguro agrícola. O Rio Grande do Sul tem sofrido muito e as seguradoras não querem mais oferecer cobertura para a região. Portanto, é necessário um subsídio significativo para o prêmio do seguro. O governo federal está querendo anunciar um investimento de R$ 500 milhões especificamente para o Estado”, afirma. Acompanhe:

A agricultura gaúcha perdeu R$ 1,3 bilhão, segundo a Confederação Nacional dos Municípios. Recentemente, o senhor mencionou que a maior causa dessa perda está relacionada a problemas logísticos devido às estradas afetadas pelas enchentes. Esse ainda é o principal problema?

Gedeão Pereira – Sem dúvida nenhuma. Porque, diga-se de passagem, o Rio Grande do Sul tem duas metades absolutamente distintas: a metade Norte e a metade Sul. A metade Norte já estava praticamente no fim da colheita de soja, faltando muito pouco. O problema maior está na metade Sul, especialmente na região arrozeira. Cerca de 70% do consumo nacional de arroz vem justamente dessa metade. 

São justamente esses os temas que estou discutindo com o ministro da Agricultura hoje [16/05 – Gedeão explica que aguarda uma ligação do ministro Carlos Fávaro]. Na realidade, as enchentes nos pegaram já no fim da colheita de arroz. Ainda faltam cerca de 15% a 20% para ser colhido. Quanto à colheita de soja, falta um pouco mais; nesta região, deve haver entre 40% e 50% ainda para ser colhida. Isso ocorre porque a última soja a ser colhida no Brasil está justamente aqui, nesta região do país.

Evidentemente, os problemas de infraestrutura se agravaram muito, afetando a logística. Esse é o grande problema do Estado do Rio Grande do Sul hoje. Estamos enfrentando muita dificuldade de acesso, principalmente na metade Norte, com consequências sérias na produção leiteira, suína e de frangos. Isso está sendo muito afetado, tanto que estamos organizando alguma logística para receber alimentação dos animais em nosso Sindicato Rural de Soledade. Já montamos uma estrutura para receber feno e bolas de pré-secado para alimentar os animais. A turma da suinocultura relata que 12.000 suínos desapareceram, levados pela água. Então, realmente é uma situação muito, muito difícil que está acontecendo na metade Norte.

Quanto a esses 40% de soja ainda a serem colhidos na metade Sul, esses grãos chegaram a ser afetados ou o problema é somente a questão do acesso por causa das estradas? 

Gedeão Pereira – Veja bem, em todo o Rio Grande do Sul, faltam menos de 20% de soja para ser colhida. Ocorre que, nesta metade Sul, esses 40% que ainda precisam ser colhidos enfrentaram um longo período de chuvas. Esse atraso na metade Sul não se deve às enchentes, mas ao período muito longo de chuvas, que paralisou a colheita e causou perda de qualidade do produto. A soja não resiste bem a períodos chuvosos prolongados; as vagens começam a estourar, os grãos caem e a qualidade diminui. 

No litoral, da Lagoa dos Patos até o Chuí, a lavoura de soja está fortemente afetada, praticamente perderam tudo. Há algum arroz remanescente a ser colhido, cerca de 15% do total da lavoura que já foi para dentro dos silos. Nestes casos, a situação está mais controlada, embora tenhamos alguns problemas pontuais com silos afetados pela água. Mas são questões pontuais.

Algumas imagens de silos alagados chegaram a viralizar. Há alguma estimativa de perda do grão armazenado nesses silos inundados?

Gedeão Pereira – Não, ainda não temos uma estimativa de perda de nada ainda, pois as águas ainda estão baixando e os danos estão aparecendo gradualmente. No entanto, trata-se de questões isoladas. Isso não é algo que cause grande preocupação, exceto para os próprios produtores afetados. É evidente que há prejuízos. Vimos imagens extremamente impressionantes, como os silos da Bianchini em Porto Alegre, que explodiram como se fossem feitos de papel. É impressionante a força do grão quando ele absorve água e os silos ficaram com muita água. Eu não saberia quantificar os prejuízos, porque esse dado nós não temos.

O senhor falou a respeito da grande perda de animais… O que os produtores têm relatado sobre isso, mas também sobre os danos ao maquinário agrícola que estava no campo?

Gedeão Pereira – Sim, vimos imagens dessas áreas afetadas, como no Vale do Rio Jacuí, no Vale do Rio Pardo e na região central do Estado, onde as enchentes levaram máquinas agrícolas. Conheço um produtor que teve 12 tratores submersos e sua propriedade foi completamente inundada. Houve danos aos silos, às máquinas, às colheitadeiras. Tudo ficou embaixo d’água. Volto a dizer que esses são casos isolados e não representam a situação geral do Estado.

Entre as propostas de ajuda aos produtores solicitadas pela Farsul ao governo, estão mais crédito para reconstrução e a suspensão de dívidas, que já foi implementada. Quais dessas propostas foram atendidas e o que mais precisa ser feito para ajudar esses produtores afetados?

Gedeão Pereira – Por enquanto, a única medida aceita pelo governo federal e já em vigor é a prorrogação dos pagamentos dos financiamentos com vencimento até 14 de agosto – enquanto se estudam medidas estruturantes. Há muitas reconstruções necessárias, inclusive em cidades inteiras que precisam ser repensadas e que não podem voltar a existir nos mesmos lugares. No entanto, isso não está dentro da competência da Farsul ou dos produtores rurais. Pedimos essa prorrogação, que já foi atendida. Hoje, falei com o ministro [Carlos Fávaro, da Agricultura] sobre a protelação também dos pagamentos aos bancos de fábrica, que possuem recursos do BNDES. Precisamos de uma portaria ou medida semelhante do BNDES para estender esses prazos até que medidas definitivas sejam tomadas. 

Agora, é verdade que, assim como tem produtor que não pode pagar nada, tem produtor que pode pagar. Porém, é importante considerar que os produtores do Rio Grande do Sul já vinham enfrentando problemas anteriormente. Nas duas safras passadas deixamos de colher cerca de 30 milhões de toneladas de grãos, principalmente soja, devido à seca. Ou seja, o produtor já vem com desafios do passado e agora enfrenta um problema ainda maior devido ao excesso de chuvas. Portanto, há produtores que precisam, sim, de prazos mais longos para se recuperar.

O governo já sinalizou que os produtores afetados pelas enchentes devem receber atenção especial no Plano Safra 2024/25. Como esses produtores poderiam ser beneficiados e quais são as propostas em discussão para atender a essa demanda?

Gedeão Pereira – Nós já entregamos ao ministro Carlos Fávaro a proposta de 15 anos de prazo, com dois anos de carência e juros de 3% ao ano, para auxiliar na reconstrução da vida desses produtores afetados.

Nós precisamos avaliar cada situação muito caso a caso. Como mencionei, há pessoas que não foram tão atingidas e outras que foram barbaramente prejudicadas. Estamos diante de uma calamidade grave, uma colheita mais ou menos, com muitos problemas pontuais. Por isso, é importante analisar essas medidas específicas para ajudar esses produtores. Para aqueles que não foram afetados, podem seguir normalmente com um Plano Safra regular. No entanto, observamos que no Plano Safra há poucos recursos disponíveis com juros subsidiados. A maioria dos recursos é oferecida com juros de mercado. Isso já ocorreu no ano passado.

Considerando o cenário nacional, quais são as expectativas para o próximo Plano Safra?

Gedeão Pereira – Nós temos discutido amplamente com o governo e o Ministério da Agricultura a questão do seguro agrícola. O Rio Grande do Sul tem sofrido muito e as seguradoras não querem mais oferecer cobertura para a região. Isso é uma realidade. Portanto, é necessário um subsídio significativo para o prêmio do seguro. Precisamos reavaliar o sistema de seguro para o Rio Grande do Sul. O governo federal está querendo anunciar um investimento de R$ 500 milhões especificamente para o Rio Grande do Sul. Lembrando que no plano agrícola do ano passado não houve nem menção ao seguro. Este ano, também enfrentamos problemas no Mato Grosso, com uma quebra de safra de aproximadamente 17%. Parece haver um interesse maior nesta questão para o próximo Plano Safra, o que seria crucial, especialmente em relação ao seguro agrícola.

Em relação às discussões com o ministro, quais têm sido as respostas dele para a Farsul?

Gedeão Pereira – Realmente, essa foi a resposta dele: a prorrogação até 14 de agosto e o anúncio de R$ 500 milhões para o seguro agrícola aqui na região. Além disso, estamos dedicando muita atenção à questão do arroz. Esse é um ponto crucial, considerando que 70% da produção para o consumo do Brasil vem do Rio Grande do Sul. O governo está demonstrando preocupação. Estamos dizendo ao governo que não vai faltar arroz, que não ocorrerá desabastecimento do mercado, a menos que seja devido a problemas de logística. Essa é a discussão em andamento.

Como o anúncio feito pelo governo sobre a importação de arroz, certo?

Gedeão Pereira – Exatamente, isso nos parece absolutamente desnecessário. O Rio Grande do Sul tem arroz suficiente para abastecer o mercado. No momento em que o governo anunciou uma possível importação, que não tem de onde tirar, a não ser da Tailândia ou de outro país asiático, aqui no Mercosul não há, ele simplesmente bagunçou o mercado. O mercado está hoje com os nervos à flor da pele, subindo preços e tal, em função de uma possível intervenção desnecessária no mercado. Se o governo tivesse permitido que o mercado seguisse seu curso normal, possivelmente o dano seria menor. Achamos que ele [o governo] está fazendo anúncios intempestivos, sem o devido conhecimento, especialmente por parte do MDA [Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar] e da Conab [Companhia Nacional de Abastecimento], anunciando a disponibilidade de arroz a um preço subsidiado para o consumidor. Isso aí não é factível.

A Conab anunciou que o quilo do arroz será vendido a R$ 4.

Gedeão Pereira – Quatro reais. Abaixo do preço do mercado internacional, bem abaixo. Ou seja, significa que o governo vai subsidiar. Não sei se não é o produtor estrangeiro, porque se ele anuncia que é arroz importado… O mercado lá fora, nos países do Mercosul, explodiu com esse anúncio. Então, vai ter dificuldades.

Neste momento, nos preocupa muito a questão urbana. Porque realmente milhares de pessoas perderam suas casas. Como reabilitar a vida de 400, 500 mil pessoas? O Rio Grande do Sul precisa de uma condição excepcional de créditos, de recursos para poder se reestruturar, porque a desgraça é muito grande. Essa é a maior preocupação.

 

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