A cinco meses do fim do Plano Safra 2019/20, o setor de máquinas e equipamentos agrícolas está apreensivo com a indefinição do Moderfrota – principal linha de financiamento do segmento com juros subsidiados – para o ciclo 2020/21, que começa em julho. Para a atual temporada 2019/20, que vai até 30 de junho, os recursos da linha devem se esgotar em meados de fevereiro, segundo cálculos da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). O déficit, conforme a entidade, pode chegar a R$ 2 bilhões ao fim da safra. “Esperamos que esse cenário não se repita no próximo ciclo, diz o vice-presidente da Anfavea, Alfredo Miguel Neto. “Os sinais do agronegócio estão muito favoráveis e sustentam crescimento.” Ele explica que a incógnita se refere à política agrícola do governo para a temporada 2020/21. “Não se sabe como será”, diz.
Representantes de empresas e entidades do segmento, consultadas pelo Broadcast Agro, se dizem cautelosos e apreensivos. “O governo tem dito que vai mudar a política, porém não sabemos exatamente o que será feito. A nossa expectativa é que seja uma transição gradual para minimizar os eventuais prejuízos nas vendas”, disse o presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ), Pedro Estevão Bastos. Miguel Neto, da Anfavea, diz que as dúvidas do produtor “são muitas”: “quais serão as condições do Plano Safra? O que será alterado? Todos os portes de agricultor serão atendidos? Haverá recurso adicional? Que taxas serão aplicadas?”
A ausência de detalhes, segundo as próprias empresas, pode afastar os produtores de investimento em tecnologia para as lavouras. Em um setor de margens apertadas e reduzidas, o planejamento quanto à disponibilidade de capital torna-se crucial para aproveitar as oportunidades. “Se o agricultor não souber como será a oferta de crédito, ele vai protelar as vendas para a próxima temporada. Essa insegurança é muito ruim para a indústria”, considera o gerente de Marketing Comercial da Case IH, Eduardo Penha, justificando a importância da divulgação do Plano Safra com antecedência ao fim da safra vigente.
Outro ponto sensível para o setor é o nível dos juros controlados. No Plano Safra 2019/20, o governo elevou a taxa para 8,5% a 10,5% por ano, o que não agradou as montadoras. “Não basta oferecer crédito, tem de ofertar com juros atrativos, com taxas viáveis e com base no atual patamar da taxa Selic”, reforça Miguel Neto, que também é diretor de Assuntos Corporativos da John Deere na América Latina.
Embora ofereçam alternativas de financiamento para os seus produtos, com parcerias para empréstimos com bancos privados ou consórcios próprios, as montadoras consideram que a postura pública tende a influenciar no apetite do produtor rural para a renovação ou a ampliação da frota. Além disso, essas modalidades do setor privado, conforme Anfavea e ABIMAQ, ainda são restritas a agricultores com alta capitalização, deixando os pequenos e médios de fora e dependentes do recurso subsidiado. “Trata-se de um setor que ainda depende de recursos subsidiados para financiar a produção, por isso, a política de crédito pesa muito sobre o desempenho e sobre a decisão de investimento do produtor”, pondera Estevão Bastos.
Otimismo cauteloso
A apreensão do setor se deve aos resultados do ano passado. Em 2019, a comercialização interna de máquinas agrícolas e rodoviárias caiu 8,4% em comparação com o ano anterior para 43.735 unidades, conforme dados divulgados pela Anfavea. A projeção para o ano era de alta de 10% a 11%. O desempenho negativo é atribuído pelos representantes da indústria ao atraso na divulgação da política pública de financiamento agropecuário.
Para reverter o cenário observado no último ano, o setor aposta na perspectiva de produção abundante de commodities agrícolas associada à estabilidade da taxa Selic. “Estruturalmente, os ingredientes do setor sinalizam aumento da receita do produtor. O único ´senão´ é a indefinição atual quanto à política agrícola a ser adotada”, avalia Estevão Bastos, que também é diretor de Relações Institucionais da Jacto.
Apesar dos fatores positivos para a cadeia, a previsibilidade quanto aos recursos que serão disponibilizados pelo governo federal será determinante para a recuperação nas vendas. “Se a política para o ano safra 2020/21 for a mesma do anterior, o desempenho do setor deve se repetir, contudo se a durabilidade do crédito corresponder ao ano safra, o crescimento é quase certo”, argumenta o vice-presidente da Anfavea. Tanto a Anfavea quanto a ABIMAQ esperam alta de 3% no mercado doméstico em 2020.
Quanto às líderes de mercado, as projeções variam entre estabilidade e alta. A norte-americana AGCO prevê crescer acima de 5% e estima o mesmo para o setor nacional. “O produtor percebe a necessidade de investimento em novas tecnologias, embora as adversidades de crédito persistam”, projeta o vice-presidente de vendas da AGCO para América do Sul, Rodrigo Junqueira. Mais cautelosa, a Case IH, subsidiária da CNH Industrial, espera que o segmento registre de estabilidade a leve alta. Gerente de Marketing Comercial da marca, Eduardo Penha, considera que o desempenho da indústria deve ficar entre o observado em 2019 e 2018 e que a empresa deve acompanhar o crescimento geral de máquinas e equipamentos.
A John Deere não divulga previsão de faturamento individualmente por país, mas espera que as vendas de tratores e colheitadeiras na América Latina fiquem abaixo do registrado no ano fiscal de 2019, encerrado em 3 de novembro. O Brasil é a segunda maior frente da companhia, atrás apenas dos Estados Unidos. Mesmo com o cenário incerto, Miguel Neto garante que a empresa vai continuar investindo na atuação nacional por meio de aquisição de empresas, ampliação de fábricas e aporte de novos maquinários. Com sete fábricas no país, a JD investe até US$ 150 milhões no País ao ano. “É a nossa forma de dizer que, apesar das incertezas, confiamos neste mercado”, diz.
Fonte: Portal Agrolink