As turbulências e as incertezas no mercado de proteína animal
No fim de fevereiro foi confirmado, no estado do Pará, um caso atípico de Encefalopatia Espongiforme Bovina (EEB), conhecido como “mal da vaca louca”. Com isso, o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) suspendeu, preventivamente, as exportações de carne bovina para a China, que se apresenta como o principal comprador de proteínas brasileiras – em 2022, 43,6% das carnes exportadas pelo Brasil tiveram como destino a economia chinesa.
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O embargo entrou em vigor no dia 23 de fevereiro e permaneceu exatamente por um mês, sendo revogado pelas autoridades da China no dia 23 de março. Embora a duração da medida tenha sido relativamente pequena, ela causou prejuízos nas exportações brasileiras de proteína bovina. Porém, é importante salientar que as perdas foram mais do que compensadas pelo aumento dos embarques de carnes de suínos e de aves para o país chinês, o que impediu uma contração no valor das exportações totais de carnes para a China. Além disso, mesmo com o embargo, as vendas externas (em dólares) do agronegócio brasileiro para a economia chinesa cresceram 3,7% nos primeiros quatro meses de 2023.
Após esse início de ano conturbado para o setor exportador de carne bovina, com o fim do embargo, a tendência é que os próximos meses sejam positivos para o setor, pelo menos em termos de volume. Isso deve ocorrer porque o número de abates de bovinos, no Brasil, vem subindo e, com a dificuldade de o mercado interno absorver toda essa quantidade de carne, faz com que os frigoríficos habilitados enviem para fora do país boa parte do volume desse produto. Em valores, no entanto, o câmbio é uma questão adicional, que poderá fazer com que o valor das exportações não cresça na mesma intensidade do que em volume.
Por fim, é importante salientar que há uma outra incerteza que ronda o setor de carnes (nesse caso, não é a bovina, mas sim a de aves), que é a chegada da Influenza Aviária no Brasil. Ou seja, no momento em que esse texto estava sendo escrito, o Ministério de Agricultura e Pecuária (Mapa) declarou estado de emergência em todo o território nacional, por conta da detecção do vírus H5N1 em aves silvestres e um caso suspeito em um paciente humano. Dessa forma, caso a doença alcance indústrias exportadoras de carnes de aves, novos embargos podem surgir, impactando novamente a cadeia de proteínas animais e, consequentemente, o agronegócio brasileiro.
Embarque de aves e suínos substituindo as exportações de carne bovina
De acordo com o levantamento do Centro de Estudos do Agronegócio da Fundação Getulio Vargas (FGV Agro), com base nos dados do Comex Stat, as exportações brasileiras de carne bovina para o mundo totalizaram US$ 2,95 bilhões nos primeiros quatro meses de 2023, o que representou uma queda de 28,5% frente ao mesmo período de 2022 (quando somou US$ 4,13 bilhões) – uma contração de US$ 1,18 bilhão.
Em relação à China, observa-se que o valor exportado de proteína bovina foi 39,3% menor no primeiro quadrimestre de 2023 do que o verificado no mesmo período do ano anterior. A redução foi de US$ 944,1 milhões, respondendo, portanto, por 80,3% da queda do valor dos embarques brasileiros de proteína bovina para o mundo.
Por outro lado, os embarques das outras carnes (aves e suínos) para esse parceiro aumentaram 48,1%, passando de US$ 760,2 milhões para US$ 1,1 bilhão. Dois pontos explicam essa forte expansão:
• Com o embargo da carne bovina, os chineses buscaram outras fontes de proteína animal para compensar a queda da oferta para o grande mercado interno dessa economia, aumentando, portanto, a demanda de carnes de aves e suínas brasileiras.
• Com a gripe aviária atingindo grandes produtores de aves do planeta, a demanda pelo produto brasileiro aumentou, já que, até abril/2023, o Brasil não constava na lista de países contaminados pela doença.
Apesar do embargo, os embarques cresceram
Mesmo com o embargo das carnes bovinas brasileiras, as exportações do agronegócio nacional tanto para o mundo como para a China aumentaram (4,1% e 3,7%, respectivamente), no primeiro quadrimestre do ano.
Além do aumento já citado das exportações de carnes de suínos e aves, a alta das vendas externas para as China foi puxada, sobretudo, pela atividade agropecuária, que expandiu 9,2% em valor – essa alta foi derivada do aumento robusto das vendas de milho e, principalmente, de soja.
O crescimento das vendas externas para a China só não foi maior porque outros setores registraram contração. A maior “âncora” foi realmente o setor de carnes bovinas, mas o setor de produção agroindustrial de alimentos de origem vegetal também contraiu significativamente (-43,8%) puxado, sobretudo, pelos produtos do refino de açúcar e óleos e gorduras (farelo de soja, principalmente).
¹ Pesquisadora do Centro de Agronegócios da FGV (FGV Agro). roberta.possamai@fgv.br
² Professor e pesquisador do Centro de Agronegócios da FGV (FGV Agro). felippe.serigati@fgv.br
³ Pesquisador do Centro de Agronegócios da FGV (FGV Agro)
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