Os cuidados necessários para que o sistema de transmissão desempenhe adequadamente as funções para as quais foram projetados
Por Joel Sebastião Alves – Eixos, engrenagens, dispositivos de acoplamentos, grupos redutores, transferência de força em ângulos variados, rotações diferenciadas, mancais, buchas, rolamentos, retentores… Esses são alguns dos componentes presentes em um sistema de transmissão e em constante movimento nas máquinas agrícolas. Esses sistemas necessitam de manutenção? E o que se deve observar na operação? Quais os cuidados necessários para que desempenhem adequadamente as funções para as quais foram projetados?
Primeiro, devemos considerar que manutenção e operação de um sistema de transmissão caminham lado a lado. A manutenção plena somente é possível com operação adequada, e vice-versa, dado que a operação correta depende da manutenção apropriada. Assim, ao abordarmos um aspecto é necessário tratar também do outro. A transmissão especificamente, que é onde o operador exerce sua prática cotidiana, requer cuidados e orientações, sobretudo em relação à embreagem, caixa de marchas e seleção dos grupos redutores.
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Conjuntos mecânicos do sistema de transmissão
Foquemos esses conjuntos mecânicos: embreagem, caixa dos grupos, caixa de marchas, diferencial e redutores finais. A força disponibilizada pelo motor é entregue ao acoplamento da embreagem e nesse conjunto se encontra a última peça do motor, que é o volante, e a primeira peça da embreagem, que é o disco de fricção.
Este acoplamento fica posicionado entre o motor e a caixa, dentro de uma carcaça metálica, vulgarmente conhecida como capa-seca, pois a maioria das máquinas utiliza o sistema sem óleo. Vale lembrar que há mecanismo banhado a óleo, atualmente raro, e acoplamento oleoso naqueles dotados de conversor de torque com sistema de marchas automático.
O sistema de transmissão convencional utiliza uma placa de pressão que comprime fortemente o disco de fricção contra o volante do motor. Ao ser acionada ela libera a compressão do disco e interrompe a transferência da força, possibilitando assim a troca de marchas ou de grupo, além de possibilitar o início do deslocamento da máquina. A embreagem é comandada pelo pé esquerdo do operador, e requer cuidados (abordados adiante).
Para que esse comando chegue à placa de pressão é necessário o dispositivo de acionamento, que pode ser mecânico ou hidráulico, e junto à placa ainda há o rolamento com a luva deslizante. Na sequência da transmissão temos acoplamento de engrenagens que compõem as caixas de grupos e de marchas – são conjuntos mecânicos compostos por eixos, engrenagens, luvas deslizantes e dispositivos de acoplamentos, mancais, rolamentos e vedadores, todos dentro de carcaças metálicas reforçadas, daí o termo “caixa”.
A seguir, a força é transmitida ao centro do eixo de tração, onde se encontra o diferencial alojado em outra carcaça metálica. É um mecanismo complexo que possibilita rotações diferenciadas para os semieixos de tração no momento em que a máquina realiza uma curva e quando as rotações das rodas devem ser diferentes e manter a tração. Esse conjunto é composto por engrenagens identificadas como planetárias e satélites.
A transferência de força em ângulo de noventa graus é realizada pelas engrenagens pinhão e coroa, que também se encontram junto ao diferencial. Após o diferencial há os redutores finais, que podem ficar junto ao diferencial, ou sobre o meio do semieixo ou ainda próximo à extremidade. Nos tratores de tração dianteira, esses redutores localizam-se junto ao cubo da roda.
Treinamento é indispensável
Seguir o manual de operação e treinamento é o básico. Um exemplo: em um trator de quatro grupos (A, B, C, D) e quatro marchas (1, 2, 3, 4) se operador selecionar C1, havendo necessidade de redução em decorrência de um esforço maior, será necessário mudar de grupo, uma operação que requer cuidado e eventualmente parar a máquina. No entanto se selecionar B4 ou B3 a velocidade do trator será a mesma com pequena correção de RPM, de modo que o motor trabalhará mais aliviado e o operador poderá reduzir com mais rapidez para B2, sem prejuízos para os conjuntos mecânicos.
É bom em ter mente: operar a máquina dentro de procedimentos adequados é fundamental para manutenção da transmissão, pois são conjuntos mecânicos em constante esforço torcional durante a execução dos serviços. Não raras vezes vemos operações completamente inadequadas. Muito treinamento ainda se faz necessário!
Recomendações
De que tipo de manutenção tais conjuntos mecânicos necessitam? Basicamente de lubrificação e cuidados operacionais. Lembre-se: sem uma operação cuidadosa não há manutenção que satisfaça, bem como sem manutenção adequada não é possível haver operação com resultados.
Boas práticas recomendadas para o sistema de transmissão:
- Escolha corretamente o implemento para o serviço a ser executado. O trator é uma máquina robusta e multifuncional, porém possui limites técnico-operacionais, os quais, quando não observados, nem com manutenção adequada se pode resolver.
- Saiba definir a marcha e o grupo para melhor desempenho da máquina. Na execução do serviço é fundamental que o operador trabalhe dentro do recomendado pelo fabricante, para obter desempenho e produtividade. Muitas vezes, na tentativa de aumentar a produtividade, os conjuntos mecânicos são prejudicados.
- Saiba executar a mudança de marcha no momento correto, para evitar que o motor sofra sobrecarga desnecessária. Os tratores atuais oferecem várias opções entre grupos e marchas, disponibilizando muitas escolhas para o operador, que deverá possuir bom domínio para executar o serviço com desempenho máximo sem prejudicar os conjuntos mecânicos.
- Use corretamente a embreagem. Saber aplicar o comando e o tempo de acionamento do pedal de embreagem exige boa capacidade técnica e agilidade com o pé esquerdo. Esse procedimento pode variar conforme o tipo de máquina, por isso, o operador deve estar atento. Caso contrário, poderá provocar impactos significativos nos eixos e mancais da transmissão. Perceber o momento exato em que o pedal começa a liberar a placa de pressão para iniciar o arrasto do disco de fricção é um domínio técnico fundamental para manter a transmissão da força dentro de uma sequência, sem solavancos prejudiciais ao mecanismo. Realizar sempre o procedimento correto, além de aumentar a vida útil da transmissão, contribui com os cuidados do implemento acoplado ao trator. É importante destacar que esses cuidados são necessários tanto ao iniciar o deslocamento da máquina quanto na troca de marchas.
- Faça revisões periódicas (manutenção preventiva), respeitando as recomendações do fabricante da máquina. Em transmissões mecânicas as manutenções básicas referem-se a troca de lubrificantes e filtros, o que varia são os períodos, pois em alguns pode ser 300 horas para filtros, e 600 horas para óleos lubrificantes – atualmente, há máquinas com períodos maiores. O importante é seguir as especificações dos produtos recomendados. Quanto aos redutores finais, quando posicionados junto ao cubo da roda, possuem períodos menores para troca do óleo. Inclui-se aqui a inspeção diária feita pelo operador: verificação do nível do óleo da transmissão, vazamentos, folga do pedal da embreagem etc. O operador é quem permanece mais tempo com a máquina, portanto, a inspeção diária bem acurada é meio caminho para boas práticas de manutenção.
É possível conciliar a prática do dia a dia rural com esses procedimentos? Parece difícil, mas é possível, sim. Basta capacidade administrativa e planejamento. Claro que o planejamento rural é complexo, pois depende de variáveis como o clima. Agora, quando não observados tais procedimentos e cuidados, os custos sobem, pois a manutenção corretiva é mais onerosa e implica em considerar que a máquina poderá apresentar problema quando estiver em serviço e ficará parada enquanto o reparo não é executado.
Com janelas de tempo cada vez mais reduzidas para preparo, semeio e colheita, percebe-se que as perdas e os custos disparam. A realidade do meio rural é bastante diversificada, ainda mais em um país de dimensões continentais como o Brasil, o que requer adaptação a cada circunstância. No entanto, é fundamental manter o foco na manutenção preventiva e na qualificação das equipes de manutenção e operação. Os resultados valem a pena.
Joel Sebastião Alves é instrutor de Operação e Manutenção de Máquinas e Implementos Agrícolas e Rodoviários *
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