Desafios 2023: fatores que produzirão uma desaceleração econômica

Desafios 2023: fatores que produzirão uma desaceleração econômica

Segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) (de outubro/22), a economia mundial deverá registrar alta de 2,7% ao longo de 2023, inferior ao resultado estimado de 2022

Por André Diz, Roberta Possamai e Felippe Serigati

Segundo projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) (de outubro/22), a economia mundial deverá registrar alta de 2,7% ao longo de 2023, inferior ao resultado estimado de 2022, com variação esperada de 3,2%. Esse cenário de acomodação das taxas de crescimento engloba tanto os países avançados (1,1% em 2023 contra 2,4% em 2022 – que configura uma desaceleração econômica) quanto os emergentes (3,7% para 2022 e 2023). 

Além disso, considerando os principais parceiros comerciais do Brasil, o cenário de menor crescimento econômico ao longo de 2023 também se mantém, com China, União Europeia e Estados Unidos expandindo, respectivamente 4,4%, 0,7% e 1,0%. 

É importante ressaltar que a economia brasileira não será exceção nesse cenário de desaceleração econômica e, em 2023, também será marcada, provavelmente, pelo menor crescimento econômico, sendo impactada, inclusive, pelas menores taxas de expansão do PIB das principais economias do globo. 

Nesse sentido, de acordo com o Boletim Focus do Banco Central, as projeções indicam alta de 3,0% para 2022, mas de apenas 0,8% para 2023. Além disso, a instituição enfatiza que as projeções para o próximo ano contam com maiores incertezas do que o usual, uma vez que a concretização das expectativas irá depender de diversos fatores, tanto internos quanto externos, sendo que os principais serão vistos, brevemente, a seguir. 

Inflação mundial elevada

O movimento de normalização da circulação de pessoas e mercadorias ao longo de 2021, após o pior momento da pandemia de Covid-19, juntamente com a desorganização da cadeia produtiva mundial, pressionou os preços de diversos bens e serviços desde o fim do segundo trimestre de 2021.

Se por um lado, o desequilíbrio da cadeia global de suprimentos (falta de peças e componentes) gerou problemas na oferta; de outro lado, as políticas fiscais e monetárias de sustentação da atividade econômica (como isenção de tributos, pagamento de auxílios financeiros à população mais vulnerável, dentre outros) mantiveram a demanda elevada.

A consequência natural do descompasso entre os fundamentos da economia foi a escalada global da inflação em praticamente todos os mercados do planeta.

Além disso, como se não bastasse esse cenário, no fim do primeiro trimestre de 2022, ocorreu o início do conflito bélico entre Rússia e Ucrânia que, dentre outras consequências, desorganizou ainda mais os mercados essenciais para economia mundial (como petróleo, gás e alimentos), aumentando, de forma geral, os preços, que já se encontravam em patamares elevados.

O resultado foi uma crescente pressão sobre os níveis gerais de preços. Combustíveis mais caros elevam os preços de todos os demais produtos pelo encarecimento do transporte. Gás mais caro eleva o preço da energia, insumo para qualquer atividade produtiva, seja industrial ou de serviços.

Por fim, a desorganização na cadeia de algumas commoditites agrícolas seja pelo conflito europeu (trigo), seja por questões climáticas no hemisfério norte (milho) ou no hemisfério sul (soja), encerram um quadro de forte pressão inflacionária.

Guerra: sem perspectiva de acabar

Conforme visto anteriormente, no final de fevereiro de 2022, foi iniciada a ofensiva da Rússia na Ucrânia, trazendo diversas consequências que, dentre as principais, está o aumento dos preços de bens essenciais, a piora do quadro de insegurança alimentar no planeta e a maior dificuldade de recuperação das economias em um contexto pós-pandemia.

Ou seja, o conflito entre essas economias do Leste Europeu já trouxe graves consequências e o prolongamento da mesma trará outras, podendo levar as principais economias do planeta a entrar em recessão ou até mesmo entrar em “estagflação” (elevada inflação e baixo crescimento econômico – uma desaceleração econômica).

A desaceleração econômica em diversas nações 

Diante de todo esse cenário adverso, a correta resposta dos bancos centrais do planeta para tentar conter a escalada da inflação tem sido a elevação das taxas básicas de juros. Esse movimento de aperto monetário, vale ressaltar, já está gerando efeitos na inflação de importantes nações, como os Estados Unidos (porém, ainda longe do ideal).

Contudo, a intensidade, a amplitude e o horizonte de persistência dessas medidas, justificam ainda mais as perspectivas de desaceleração das taxas de crescimento da economia mundial.

No caso específico da economia brasileira, por um lado, esse movimento de aumento dos juros básicos nos mercados externos mantém a taxa de câmbio em patamares mais elevados, fato que contribui para o fortalecimento das exportações e consequente encarecimento das importações.

No entanto, a dificuldade em estancar a alta da inflação, (que deve encerrar 2022 com uma alta de 5,9% e, 2023, em 5,1%), mantém as taxas básicas de juros da economia brasileira em patamares elevados (13,75% em 2022 e 11,75% em 2023), encarecendo o crédito no mercado doméstico e freando a expansão de parte dos investimentos do setor agropecuário, inclusive de máquinas e implementos.

Política de Covid-19 na China

Desde o início da pandemia de Covid-19, a China adota a política de “Covid Zero”, impondo regras bastante rígidas à sua população, com fortes controles nas fronteiras e radicais lockdowns.

Naquele momento, quando não existiam vacinas para a doença, outras nações adotaram as mesmas políticas, mas foram flexibilizando assim que as vacinas foram surgindo, ao contrário da economia chinesa, que ainda adota as mesmas medidas, com iguais ou maiores intensidades.

Essa política, além de não conter a disseminação atual do vírus que, com a variante Ômicron, tornou-se ainda mais transmissível, está restringindo o crescimento econômico do país e dificultando a recuperação da cadeia global de suprimentos no mundo inteiro, sem contar a insatisfação popular que essas medidas estão causando nos chineses.

No entanto, é importante ressaltar que, com a forte pressão popular, no início de dezembro/2022, o governo da China declarou que vai flexibilizar algumas das restrições impostas para combater a disseminação da Covid-19, porém, não deixou claro quais serão as medidas.

Além disso, as consequências para a economia e para o sistema de saúde são ainda mais incertas, uma vez que a vacinação continua em baixa no país.

Desaceleração econômica no Brasil

O Brasil, claramente, não sairá imune à desaceleração econômica das principais economias do mundo, à possível manutenção do conflito entre Rússia e Ucrânia, ao aumento dos juros em importantes nações (como Estados Unidos e países da União Europeia), bem como não saíra ileso às medidas tomadas pela economia chinesa.

Além desses fatores externos, outras razões internas, provavelmente, irão contribuir para a desaceleração do PIB nacional. Entre elas:

  • Para conter a inflação, o Banco Central tem aumentado os juros nos últimos meses. A política monetária contracionista, de modo geral, demora a gerar reflexos, devendo impactar o crescimento econômico somente em 2023.
  • Incertezas sobre a política fiscal implicam em uma moeda nacional mais depreciada, o que piora as expectativas de inflação. Com isso, o Banco Central tem dificuldades de reduzir a taxa de juros, gerando efeitos negativos para a atividade econômica.

Diante disso, fica claro que não faltam motivos para explicar a perspectiva de desaceleração econômica brasileira neste ano, uma vez que o cenário externo e o interno contribuem para isso.

No entanto, é importante destacar que, se o novo governo fizer um esforço para melhorar a política social, sem abrir mão da fiscal, o país teria muito a ganhar em termos econômicos, notadamente, no longo prazo.

Agro deve passar ileso

Em 2023, o agronegócio, assim como a economia brasileira, também não deve passar ileso pela provável desaceleração mundial e pela manutenção do conflito bélico no Leste Europeu. Isso porque, esses fatores, possivelmente, deverão influenciar o comportamento das exportações do setor.

No cenário doméstico, os custos de produção podem ser pressionados pela desvalorização da moeda nacional, dependendo das incertezas sobre a condução da política fiscal e do controle das despesas públicas.

No entanto, a boa notícia fica por conta de uma nova expansão da safra, que deve atingir 293,6 milhões de toneladas em 2023 (IBGE), da manutenção do crescimento da produção animal (IPEA) e pela alta esperada do PIB da agropecuária em 4% ao longo dos próximos 12 meses (BACEN).

¹ Mestre em Economia Aplicada pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ-USP) e pesquisador do Centro de Agronegócios da FGV (FGV Agro).

² Mestre em Agronegócios pela Escola de Economia de São Paulo (EESP/FGV) e pesquisadora do Centro de Agronegócios da FGV (FGV Agro). roberta.possamai@fgv.br

³ Doutor em Economia pela Escola de Economia de São Paulo (EESP/FGV), professor e pesquisador do Centro de Agronegócios da FGV (FGV Agro). felippe.serigati@fgv.br

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