A gestão de qualidade em sistemas de semeadura

A gestão de qualidade em sistemas de semeadura

Uma abordagem sobre a aplicação das teorias que norteiam a gestão operacional e administrativa na produção de grãos

Por Afonso Peche Filho e Roberto da Cunha Mello

Alisando formas de gestão operacional de diferentes locais do Brasil, podemos afirmar que é marcante a falta de conhecimento por técnicas que monitoram e promovam a qualidade nas operações agrícolas. O conceito da qualidade operacional fica muito atrelado à qualidade de insumos e pouco foco tem-se na melhoria contínua do desempenho. Além disso, os administradores e gerentes aceitam passivamente o uso inadequado da tecnologia. É comum encontrar lavouras com defeitos operacionais básicos, com alto risco de geração de impactos ambientais, e custo operacional alto.

Uma forma de mudar essa característica é buscar a inovação nos modelos de gestão e investir  na capacitação de gerentes e pessoal de apoio. É necessário promover mudanças, modernizar e avançar para aperfeiçoar a utilização tecnologia disponível. 

Neste contexto, a filosofia e as técnicas da qualidade total são ferramentas poderosas que podem contribuir com mudanças significativas e consolidar uma nova ordem na gestão operacional que é a convivência com o controle de qualidade e com a melhoria contínua. 

O objetivo deste artigo, divido em duas partes, cuja primeira vocês acompanham abaixo e, a segunda, na edição 74, é contribuir para a discussão sobre aplicação das teorias que norteiam a gestão operacional focada na qualidade de sistemas de produção de grãos.  

Fundamentos da gestão de qualidade

Gestão da qualidade é tanto uma filosofia quanto um conjunto de conceitos-guia, princípios e práticas que representam os fundamentos de uma organização em contínuo aperfeiçoamento. Aplica-se aos recursos humanos e aos métodos quantitativos e subjetivos para o aperfeiçoamento dos materiais e serviços, para melhoria de todos os processos internos e para aumento da capacidade da sua empresa em atender as necessidades atuais e futuras dos clientes e do mercado. Integra ações da administração, do gerenciamento e do operacional. Integra esforços para otimização da tecnologia num processo disciplinado, claro e contínuo de aprimoramento de processos.

Gestão da Qualidade Total significa um conjunto de ações através do qual uma organização cria e sustenta uma cultura comprometida com o contínuo aprimoramento. Gestão da qualidade total de acordo com Hunt, 1994, trata tanto da qualidade do gerenciamento como do gerenciamento da qualidade. Isto envolve cada um dentro de uma organização num esforço sistemático e de longo prazo para desenvolver processos flexíveis e sensíveis, orientados para o consumidor e de constante aprimoramento da qualidade.

A organização que adota a Gestão da Qualidade Total estará buscando deliberadamente criar um ambiente de trabalho dinâmico e positivo, fomentando o trabalho de equipe, aplicando métodos quantitativos e técnicas analíticas, apoiando a criatividade e o talento de todos os seus funcionários.

A filosofia de gestão da qualidade busca a compreensão do conceito de variação e suas implicações no aprimoramento dos processos. A gestão da qualidade total atinge todas as formas de trabalho e aplica-se igualmente a cada pessoa dentro das organizações, incluindo a alta administração, o pessoal de supervisão, os prestadores de serviços, pessoal da produção, funcionários administrativos e operários.

A Gestão da Qualidade não é um fim, mas um caminho em direção ao aprimoramento.

Feigenbaum, 1994 apresenta 9 fatores influenciadores da qualidade, e neles as organizações devem ter atenção:

Mercados: ditam as regras, mudam sempre, principalmente para empresa que procuram intensificar a qualidade ofertada a seus clientes.

Dinheiro: as recessões obrigam a revisão de custos, a diminuição dos custos proporciona ações para eliminação de retrabalho e aprimora a competitividade.

Gestão: É a alternativa para o aperfeiçoamento e a busca pelos altos índices de qualidade.

Informação: os sistemas cada vez mais técnificados obrigam a gestão para criar qualidade.

Máquinas e Mecanização: as inovações tecnológicas caminham muito próximas da qualidade.

Materiais: alternativas mais econômicas e menos poluentes geram produtos com qualidade.

Montagem de Produtos: a observação, as exigências, detalhes possibilitam a confecção de um produto final com qualidade. 

Pessoas: o capital intelectual é o maior investimento das empresas.

Motivação: a recompensa é necessária para funcionários que se destacam de forma criativa e inovadora.

Entre importantes conceitos que norteiam a exploração agrícola podemos destacar pelo menos seis que expressam a prática de uma agricultura focada no aprimoramento contínuo do seu sistema de produção.

O termo Sistema significa um conjunto de fatores, componentes ou elementos que se integram direta ou indiretamente de maneira que a modificação ou alteração de um acaba afetando os demais. Então o Sistema de Produção de Feijão pode ser definido como um conjunto de elementos integrados para ambientes agrícolas produtivos e lavouras competitivas.

Gestão significa o conjunto de atividades coordenadas no sentido de viabilizar a administração, a gerência e a operacionalização de uma organização ou um sistema de produção agrícola. 

Monitoramento operacional  é uma ferramenta de acompanhamento do ambiente operacional antes, durante e depois da execução com o objetivo de caracterizar o comportamento de elementos que influenciam na qualidade dos resultados. Entre os elementos de monitoramento nas operações podemos destacar: previsões e variações climáticas, tipo e estagio fisiológico das plantas de cobertura (mato ou cultivos), grau de cobertura do solo, umidade do solo, germinação e estado fisiológico de plântulas, nível de desgaste de máquinas, índice de quebras, armazenamento e consumo de insumos, potencial e riscos de geração de impactos ambientais, segurança e saúde dos operadores, perdas, desperdícios e defeitos.

Controle operacional pode ser definido como um instrumento de averiguação se as atividades efetivas estão ocorrendo de acordo com as atividades que foram planejadas. Na prática o controle pode ser entendido como a coleta de informações em tempo real e a comparação dos resultados com padrões previamente estabelecido com a finalidade de corrigi-los se necessário. O controle de qualidade operacional consiste em ações para manter os padrões dentro de uma norma, regra ou diretriz pré-estabelecidas. São ações para garantir a qualidade dos resultados operacionais.

Qualidade operacional pode ser definida como o resultado que atende em maior ou menor intensidade as expectativas criadas em função das recomendações técnicas e da tecnologia utilizada. Um ponto fundamental na gestão operacional é ter estratégias para monitorar e controlar a qualidade dos resultados operacionais. 

Na semeadura, um ponto fundamental para o entendimento da gestão na qualidade operacional é percepção da integração de ações administrativas, gerenciais e executivas influenciando no resultado da operação.

Confira, no quadro abaixo, os sete mandamentos da execução eficiente:

 

Ações necessárias no planejamento

Para fins de entendimento sobre a gestão da qualidade definimos que todas as atividades que envolvem burocracia fazem parte do administrativo, assim ações relacionadas com planejamento, custos, compras, vendas, treinamento são exemplos de ações administrativas que potencialmente exercem influências sobre a qualidade operacional da semeadura. 

Um bom planejamento operacional prevê tempo e recursos para avaliar o estado estrutural das máquinas bem como as condições da superfície e subsuperfície do solo. Ao estabelecer um plano para recondicionar a semeadora para uma nova jornada de trabalho o administrador está dando condições para que a operação ocorra livre dos efeitos de desgastes e fadigas das peças.

As substituições que por ventura são realizadas necessitam de um tempo para serem ajustadas e testadas no contexto funcional da máquina. Esse ajuste funcional é fundamental para que não ocorram surpresas na hora que a semeadura começar.

A decisão sobre a qualidade do insumo a ser utilizado na máquina é de caráter administrativo e influencia diretamente no desempenho operacional. Para questões relacionadas com peças e insumos (sementes, graxa e fertilizantes) e peças vale a premissa básica: “Não existe qualidade na semeadura sem garantia da qualidade de peças e insumos”. 

O treinamento operacional também é uma atividade administrativa que influencia muito na qualidade final das linhas de plantio. Em primeiro lugar é importante entender que cada safra é um novo desafio. Entender que em operações agrícolas o que já foi realizado é um passado que não volta mais, só resta resultados positivos e negativos.

O treinamento de operadores deve contemplar assuntos relacionados com os resultados da safra anterior e estratégias operacionais para a safra futura. Lembrar que o treinamento operacional para a semeadura não envolve somente operadores e sim ajudantes (badecos e auxiliares), envolve também logística e fisiologia vegetal. 

A gestão da qualidade em sistemas de semeaduraPara fins de entendimento sobre a gestão de qualidade definimos que todas as atividades que envolvem liderança, condução, orientação e controle fazem parte da gerência, assim ações relacionadas com desenvolvimento profissional, formação de equipe, escalação de pessoal, ritmo e metas operacionais, elogio, punição, eficácia e eficiência são exemplos de ações gerenciais que potencialmente exercem influências sobre a qualidade operacional da semeadura. 

Cabe ao gerente traçar o perfil e formar boas equipes, saber estimular e tirar o máximo dos seus profissionais. Com o nível de tecnologia que os gerentes têm a disposição é inaceitável entregar a operação de semeadura a colaboradores não habilitados para tal. O gerente como um maestro tem que conduzir a semeadura do começo ao fim num padrão de qualidade que permita otimizar todo potencial genético do cultivar escolhido. Todos sabem que não basta germinar é preciso que a planta chegue à colheita produzindo muito mais do que foi investido nela. 

O ritmo operacional é outro fator importante na semeadura pois está relacionado com o clima e com o período que o cultivar impõe. Normalmente, no Brasil, a “janela de plantio” é pequena para o número de semeadoras disponível na propriedade. Nestas condições começar e terminar a semeadura vira um dilema para o gerente, pois as condições do solo impõe muitas restrições ao pleno desempenho dos componentes da máquina. 

Uma diretriz gerencial que estimule os operadores a aumentar o ritmo da operação somente aumentando a velocidade fatalmente vai comprometer a qualidade da lavoura. Os gerentes precisam encontrar soluções para operar com qualidade no “seco ou no molhado” e estimular as equipes buscarem estratégias para acertar mais em condições adversas de plantio. 

Normalmente, os gerentes agrícolas brasileiros não trabalham norteados pelos conceitos de eficácia e eficiência operacional e isso conduz a uma orientação deficiente para as equipes. Operar com eficácia é executar a operação corretamente, ajustada as condições para produzir resultados dentro dos padrões de qualidade agronômica. Operar com eficiência é repetir os padrões de qualidade nas diferentes condições do terreno, buscando sempre um menor custo, sem paradas sem perdas e sem desperdícios. 

Para fins de entendimento sobre a gestão de qualidade definimos que todas as atividades que envolvem execução, função, objetivo, procedimentos, padrões, desempenho, fazem parte do operacional, assim ações relacionadas com regulagens e operação de máquinas, logística, abastecimento, lubrificação, manutenção, apontamentos, controle são exemplos de ações operacionais que exercem influências sobre a qualidade da semeadura.

Um ponto fundamental para a gestão de qualidade operacional é entender que a empresa precisa adotar padrões de desempenho, que contemplem ações que expressam os esforços em atender as exigências que a tecnologia adotada impõe. Assim os padrões operacionais na execução passam por entender os componentes das semeadoras e as suas relações com o solo, com a planta e com a jornada de trabalho. 

Entender as relações dos componentes da semeadora com as condições do solo vai permitir orientar muito bem a execução para atender os padrões de qualidade e resultar numa linha que atinge os objetivos tecnológicos da empresa. 

Entender as relações dos componentes com a planta vai permitir orientar a execução para que os resultados contribuam com o perfeito desenvolvimento fisiológico da planta.

A qualidade operacional da semeadura é responsável em grande parte pelo sucesso da fase germinativa que é fundamental para uma boa produção. Ela é também muito influenciada pela qualidade da graxa e pela qualidade do serviço de lubrificação. Portanto a aquisição da graxa deve primeiro atender as especificações técnicas recomendada pelo fabricante e depois vem o preço e a disponibilidade de entrega. A capacitação dos profissionais que vão lubrificar e fazer a manutenção mecânica ficam a cargo do administrativo. 

Afonso Peche Filho e Roberto da Cunha Mello são pesquisadores científicos – Instituto Agronômico

 

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