Prezados leitores! No final do século passado se destacou uma vertente técnica, defendida por diversas instituições de países tidos como desenvolvidos, que a próxima moeda que definiria as riquezas coletivas e globais seria a energia. Ou seja, a rentabilidade dos indivíduos, das empresas e dos países seria definida pela eficiência com que usariam a energia e o Japão foi considerado como modelo para esta nova economia. Pois bem, as expectativas não se confirmaram e esse tema foi atropelado pelas mudanças climáticas e os parâmetros ambientais, que vem dominando o cenário neste primeiro quarto do Séc. XXI, desde o Protocolo de Kyoto de 1997, ironicamente no Japão.
Energia x Ambiente
A interface entre os temas energia e ambiente é ampla e devemos considerar que o alerta climático que foi dado em Kyoto ressalta as altas taxas de emissão de gases de efeito estufa (GEE) emitidos justamente pelas diferentes formas de conversão de energia que, desde a revolução industrial no Séc. XVIII, emprega preferencialmente e sistematicamente a combustão.
Atualmente, o que se discute conceitualmente e mais amplamente é o que se chama “modelo de desenvolvimento”. É inegável que a sociedade humana teve um acentuado acréscimo de confortos e qualidade de vida nas últimas décadas, mas a um custo ambiental e social muito alto. Ambiental por estarmos exaurindo nossas fontes de energia do planeta, como o petróleo, sem buscarmos uma alternativa viável e causando um acúmulo de GEE na atmosfera sem precedentes na história. Do ponto de vista social, esses benefícios foram sendo consolidados como bens e serviços comercializáveis e, portanto, geradores de riquezas e limitando o acesso. Usemos o fogão a gás como exemplo.
Antes de sua popularização em 1837, todas as famílias e cozinhas usavam a lenha ou o carvão na cocção dos alimentos. O surgimento do fogão veio como uma praticidade, mas poderia ter sido considerado como estratégia para reduzir a extração de lenha e para redução da insalubridade nos ambientes domésticos, em função da redução da fumaça. Pois bem, o fogão a gás e o gás empregado poderiam ser alvos de programas sociais facilitando o acesso a esses itens.
Há casos de países que tiveram suas florestas dizimadas para uso como lenha e boa parte disso para cozimento, sendo constatado em pleno movimento internacional de redução dos desmatamentos. Curiosamente, estamos assistindo neste momento as articulações do governo federal do Brasil para reduzir o preço do gás, para facilitar seu acesso às famílias menos favorecidas.
Uma política ou estratégia de preservação ambiental passa necessariamente por viabilizar fontes alternativas de energia e isto é uma prioridade mundial. Vejam a crise energética que se aproxima da Europa, devido a guerra na Ucrânia e a descontinuidade de fornecimento de gás natural pela Rússia, fonte de energia esgotável e altamente emissora de GEE para a atmosfera.
Na década de 1970 aconteceu a mesma coisa, mas em nível mundial, foi a crise do petróleo e lá se vão mais de 50 anos. Muita coisa poderia ter sido feita em termos de desenvolvimento de fontes renováveis de energia neste período.
Energia na agricultura
Como em todos os demais setores, a agricultura é dependente de fontes de energia para desenvolver suas atividades. Daremos ênfase aqui nas fontes de energia para as atividades no âmbito da produção agrícola, ou seja, “da porteira para dentro”. Está claro que considerando a maioria das atividades exercidas em uma propriedade agrícola, duas fontes de energia são as mais comuns: elétrica e de combustão.
A energia elétrica é usualmente empregada como fonte estacionária e em geral é fornecida pela rede de distribuição pública, feita por uma concessionária. Além de todos os aspectos de conforto das pessoas, como iluminação, conservação de alimentos, lazer e entretenimento e aquecimento de água, entre outros, a eletricidade aciona a maioria dos equipamentos auxiliares ou complementares, em função das diferentes atividades numa propriedade, como: oficina, armazéns, transportadores e elevadores, aquecedores, misturadores, bombas d’água e processadores, entre outros. Pelas suas características de versatilidade e eficiência, se tornou de grande utilidade em uma propriedade agrícola.
Para algumas atividades, em geral associada com a pecuária, essa fonte de energia se tornou absolutamente imprescindível e, pela demanda realizada, passou a ser um item importante nos custos de produção, requerendo estratégias para otimizá-la.
Uma alternativa é substituir os motores elétricos em serviços em que há alternativas, como no bombeamento de água. Onde há potencial, podem ser empregados cata-ventos, rodas d’água e carneiros hidráulicos, por exemplo. Trata-se de opções que já foram empregadas com maior frequência, mas que foram sendo paulatinamente substituídas pelos motores elétricos, mas que agora, diante deste contexto de tendências de alta nos custos da energia elétrica, voltaram a ser opção. No mercado há equipamentos de boa qualidade e muitas informações técnicas para desenvolver um bom projeto dessas alternativas.
Até recentemente ficou impedida por lei a geração própria de energia elétrica, que agora é regulamentada. Portanto, outra alternativa interessante é avaliar a possibilidade de geração de energia elétrica na propriedade agrícola. Das possibilidades que há, a geração fotovoltaica é a que está mais desenvolvida e com a maior expansão, em função dos avanços obtidos nas placas solares e na adequação legal para tal. Trata-se de uma boa opção de redução de custos de produção.
Fontes estacionárias e móveis de energia
Como já está implícito, fontes móveis de energia são aquelas que fornecem energia em deslocamento, permitindo associar a realização de algum trabalho em movimento, caso típico das operações agrícolas. São exemplos:
- Motores de combustão interna, que equipam os tratores por exemplo;
- Tração animal;
- Tração humana.
Fontes estacionárias são aquelas que fornecem energia de forma estática, sem deslocamento, como:
- Motores elétricos;
- Cata-ventos;
- Rodas d’água;
- Carneiro hidráulico para bombeamento d’água.
Combustão
Conhecida tecnicamente como energia térmica. Parte do princípio de realizar uma combustão controlada, para que o calor seja empregado para acionar algum componente. O exemplo clássico são os motores de combustão interna, que equipam veículos de passeio, caminhões, tratores, alguns trens, navios, aviões e outros.
A grande vantagem desses motores é a sua versatilidade, equipando desde equipamentos bem pequenos, como alguns aeromodelos ou automodelos, por exemplo, até grandes navios. Ele também se adapta aos mais variados empregos e combustíveis, como gasolina, diesel, gás natural e GLP (gás liquefeito do petróleo), etanol, metano e gasogênio.
Atualmente a expressiva maioria das operações agrícolas mecanizadas são realizadas com equipamentos dotados de motores de combustão interna, ciclo diesel. Em função disso, podemos afirmar que a energia térmica é a mais empregada na agricultura e deverá continuar assim por um longo tempo.
Vem se pesquisando alternativas e há sempre a expectativa do emprego de motores elétricos na mecanização agrícola, como vem acontecendo nos veículos de passeio. Como já comentado no artigo da edição passada, essa mudança para motores elétricos esbarra na limitação das baterias. A potência demandada pelas operações agrícolas é muito maior do que de um veículo de passeio, o que exige baterias muito grande e pesadas.
Outro problema é que essas baterias são muito nocivas ao meio ambiente, tanto na sua fabricação, pois empregam matérias primas escassas, como no seu descarte, por serem altamente poluentes. Em analogia aos veículos de passeio, esse tema do descarte das baterias já está assumindo proporções preocupantes e deve exigir um reposicionamento dos fabricantes de veículos. Portanto, a eletrificação dos tratores agrícolas está muito distante e há quem diga que não acontecerá.
O que é combustão
Trata-se de uma reação química entre um combustível e o oxigênio, que para iniciar precisa de uma fonte de calor, chamado de ignição. O resultado desta reação são os resíduos gasosos que estão na fumaça, sólidos, nas cinzas, mas também emite luz e, o mais importante, gera CALOR. Este calor que é o empregado para acionar máquinas e equipamentos. Existe uma ampla gama de combustíveis, como: lenha, carvão vegetal e mineral, gases como metano, GLP (gás liquefeito do petróleo), gás natural, etanol e derivados de petróleo para citar alguns.
Combustíveis
Nos resta voltar as atenções aos combustíveis e retomar a discussão do desenvolvimento de combustíveis alternativos. Trata-se de uma estratégia que já adotávamos no Brasil há mais de 10 anos, mas que infelizmente foi sendo abandonada por falta de incentivo nas pesquisas. Alguns caminhos já foram desenhados, basta retomar esses estudos com uma política adequada de investimentos em inovações.
A proposta partia do princípio de se desenvolver um combustível renovável, assim como foi com o biodiesel. Porém, é fundamental que esses estudos e avaliações sejam retomados e continuados. Uma linha que parecia prosperar foi a das misturas de componentes de origem vegetal, visando substituir o óleo diesel.
Estudos realizados desde 2010 pela Agronomia UEL, Embrapa Soja e UNAERP mostraram a viabilidade no emprego de misturas ternárias, com biodiesel, etanol e óleo vegetal, com desempenhos promissores em testes de bancada em motores ciclo diesel convencionais. As expectativas para se encontrar um combustível renovável para substituir o óleo diesel eram enormes. Paralelamente, discutíamos algumas adequações que poderiam ser realizadas nos motores ciclo diesel para que se tornassem ainda mais eficientes que os atuais, com um novo combustível. Infelizmente essas linhas de pesquisas foram interrompidas por falta de apoio financeiro, restando algumas inciativas isoladas, mas deixaram claro que há caminhos a serem seguidos.
Em nossa opinião, as melhores alternativas de longo prazo para que haja uma adequação da Mecanização Agrícola ao conceito de uma Agricultura Sustentável estão no desenvolvimento de um combustível renovável de origem vegetal, que acione um motor ciclo diesel de nova geração com muito mais eficiência, com redução na emissão de poluentes e com balanço de carbono positivo, ou seja, emita menos carbono para atmosfera do que as culturas agrícolas empregadas para produzir o combustível extraiam. Isso não se trata de retórica, mas sim de fatos que estão próximos de se concretizarem, fiquem atentos.
Boas colheitas e fiquem bem.
- Professor de Mecanização Agrícola no Depto de Agronomia – UEL marubayashi.yudi@gmail.com
- Diretor da Fazenda-Escola da Universidade Estadual de Londrina leonardobruno@uel.br
- Professor aposentado UEL e consultor, ricardoralisch@gmail.com